No calor da campanha eleitoral, o debate político sobre o programa “novas oportunidades” tem sido marcado pelo oportunismo eleitoralista. O oportunismo de quem pega no pior senso comum ressentido e estigmatiza quem procurou melhorar as suas qualificações. E o oportunismo de quem utiliza essas mesmas pessoas como uma medalha para colocar ao peito ou sugere que de uma clientela se trata que deveria agora pagar com o voto no governo o seu diploma. Ambos usam uma leveza imediatista para falar no assunto, ambos falam em avaliação deste programa, mas será que má fé pensar que a esta vontade de analisar a educação de adultos foi um fogacho de campanha? Talvez este velho oportunismo possa dar uma nova oportunidade para equacionar o que foi feito e repensar a educação de adultos.
Começando pelo óbvio: o país tem um deficit educativo. E deve a grande parte dos/as seus/suas cidadãos/ãs uma educação de qualidade. Assim sendo, um programa alargado de educação de adultos faz falta e continuará a fazer por muito tempo.
Apesar de ser importante compreender e valorizar o esforço de quem investiu para melhorar as suas qualificações e competências, temos de afirmar claramente que as “novas oportunidades” não são a melhor forma de combater esse deficit educativo.
Porque é um programa low cost, pensado para fazer formações rápidas e baratas a que correspondem muitas vezes diplomas expresso (centros de formação com metas quantitativas tendem a isso). Um programa low cost que da parte do governo tem a vantagem dupla de melhorar estatísticas sobre a qualificação e de dar a ilusão de melhor qualificação e de mais empregabilidade a quem o cumpra. Só que o revés claro deste low cost foi a desvalorização social dessa formação e o estigma social (e no mercado de trabalho) de que agora se faz um aproveitamento político.
Porque a um programa que em grande parte privatizou a educação de adultos no nosso país faltou e continua a faltar um controlo mínimo de qualidade. Com as “novas oportunidades” desfez-se um modelo, porventura rígido, de educação de adultos no ensino secundário tendo-se substituído por um modelo mole que se multiplicou sem nenhuma garantia de qualidade. Este modelo vive à base de formadores mais baratos e mais precários do que os professores que anteriormente asseguravam o ensino de adultos.
Por outro lado, o coração do “modelo mole” está no pressuposto de “validar competências” já adquiridas ao longo da vida. O problema não está na ideia generosa de validar competências está na sua inevitável desfiguração e no alargar demasiado do seu espectro. Parece avisado o que diz Carrilho sobre a diferença entre a certificação de competências no nível do ensino primário, por exemplo, ou nível do secundário.
É necessário contrapor a esta leveza um outro paradigma que tenha a coragem de afirmar que o que é um direito, ou seja o que paga a dívida que o país tem com estas pessoas, não é apenas um nível abstracto de certificação mas sim um nível real de competências analisadas e trabalhadas com profundidade bem como um nível real de conteúdos. Assim, temos o dever de assegurar o acesso de todos a um conjunto de informações e saberes que são fundamentais a vários níveis. E, regra geral, parece-me que esse dever dificilmente é compatível com metas de formandos a validar ou com validações feitas em três meses. Quantos dos que falam no tema conhecem por exemplo os “referenciais” de formação, ou seja os programas?
Dito isto, é preciso não deitar fora o bebé com a água do banho. Obviamente, existem formações boas e más e, até em algumas que são menos boas, há ganhos de competências evidentes em muitos formandos ao nível das línguas, das novas tecnologias, da capacidade de escrita. Mas contentar-se com isto é pouco e não diminui o fosso educativo existente neste país. Para o fazer é urgente repensar a educação de adultos em Portugal.
Carlos Carujo, Caldas da Rainha
Lendo seu blog pensei até que se tratava da educação no Brasil. Aqui também temos problemas muito semelhantes, principalmente no que se refere à educação de jovens e adultos.
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