A proposta de revisão curricular apresentada pelo governo assenta em três pilares:
- O fim das áreas curriculares não disciplinares de Formação Cívica e Estudo Acompanhado, a juntar à já extinta Área de Projecto, constituem uma prova de fé na arrumação dos saberes em prateleiras incomunicáveis. É até caricato regressar a uma situação em que a escola pública continua a oferecer a Educação Moral e Religiosa e prescinde da formação cidadã. É a visão do aluno como receptor de conhecimentos e nunca como agente capaz de mudança e intervenção social, aproveitando o balanço da desvalorização da política que se torna cada vez mais um apêndice da ditadura dos mercados.
- A desvalorização do ensino artístico e tecnológico: no 2º ciclo, a disciplina de Educação Visual e Tecnológica é partida em duas e o total de horas diminui, com a agravante de passarem a ser ministradas por apenas um professor em sala de aula. Trata-se de hostilização das artes e do saber criativo e prático, ao abrigo de uma concepção puramente expositiva da transmissão de conhecimentos.
- O desinvestimento no ensino experimental: se aumenta o número de horas nas ciências no 3º ciclo a verdade é que isso é compensado negativamente em vários ciclos pelo fim ou redução dos desdobramentos de turmas nas aulas experimentais. Ou seja, teremos um professor a coordenar as experiências científicas de 30 alunos em sala de aula, que naturalmente se limitarão a ver o professor fazer…
O resto são pequenos ajustamentos: o aumento da carga horária de história e geografia já era utilizado como opção pela maioria das escolas; e retirar uma disciplina de opção no 12ºano acaba por empobrecer o currículo de todos até porque a escolaridade obrigatória é agora de 12 anos.
Esta reforma curricular, acompanhada pela decisão de pôr fim à vigência do “ensino por competências” - com vista a ser trocado pelo “ensino pela transmissão de conhecimentos” - confirma o conservadorismo bafiento desta equipa ministerial. Desenha-se um modelo de escola teórico, livresco e com apelo privilegiado à memorização. É a primazia do saber recitar em detrimento do saber fazer. É, de facto, um ensino mais pobre, mais barato, com menos professores, e mais conforme as necessidades e os desejos de quem vai mandando no país e no mundo.
Pagam os professores mas pagam principalmente os alunos. Sairão da escola com uma residual capacidade crítica, com poucas competências práticas, experimentais e artísticas, e com um razoável saber enciclopédico bem arrumadinho em gavetas cheias de pó. Talvez lhes sirva para enviar cupões para o “Quem quer ser milionário” ou “o Elo mais fraco”. Boa sorte.
Miguel Reis
Miguel Reis
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