quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Texto aprovado pelo Conselho Pedagógico das Escolas de S. Julião da Barra

Texto aprovado pelo Conselho Pedagógico do Agrupamento de Escolas de S. Julião da Barra reunido a 13 de Fevereiro de 2008
O Conselho Pedagógico (CP) analisou a situação criada pelo Ministério da Educação (ME) ao decidir a implementação da Avaliação do Desempenho Docente (AAD), a partir de Janeiro de 2008.
Entendemos que esta matéria deve ser analisada de um duplo ponto de vista:
A) Considerando a filosofia política subjacente a esta estratégia ministerial, e avaliando-a através da nossa experiência de ensino e da nossa formação científica e deontológica;
B) Considerando os dados objectivos impostos por um fluxo legislativo ininterrupto, donde se destacam o ECD (Estatuto da Carreira Docente) e o Decreto Regulamentar 2/2008 de 10 de Fevereiro, com todos os despachos, recomendações e observações anexas que diariamente nos chegam.

A) Considerando a filosofia política subjacente à estratégia ministerial, e avaliando-a através da nossa experiência de ensino e da nossa formação científica e deontológica,
1) - É nosso parecer que este modelo de ADD está em absoluto desacordo com a dinâmica organizacional da escola. É um modelo desmedidamente burocrático, orientado para a competição entre pares, em vez de favorecer o trabalho de equipa (mau grado os itens que aparecem nesse sentido), previsto para a avaliação empresarial. Conduzirá, inevitavelmente, ao prejuízo do ensino (na óptica dos professores) e da aprendizagem (na óptica dos alunos). Acrescenta ao trabalho docente uma sobrecarga de burocracia que nos impedirá de estudar, de preparar correctamente as aulas, de acordo com as turmas e os perfis dos alunos, de colaborar com outros colegas, a não ser nas hipóteses teoricamente previstas para a avaliação, que nos coagirá a modelos de planificação e preparação de aulas intermináveis e não exequíveis na prática.
2) - A própria avaliação dos alunos estará submetida a metas prévias que correspondam aos perfis de desempenho indicados pelo ME. Sem que tal signifique uma voluntária «tolerância» para atitudes e aproveitamentos menos exigentes, a própria sobrecarga de trabalho que sobre os professores recairá, terá como consequência inexorável uma menor capacidade de execução no que toca ao desenvolvimento dos programas (que, curiosamente, se mantêm, no meio de tanta reforma pedagógica…) e das actividades que promovam uma avaliação contínua e personalizada.
3) - Devemos ainda salientar que tudo indica que os nossos horários não venham a ser aliviados para corresponder a estas solicitações burocráticas. O efeito óbvio será a criação e divulgação de «modelos únicos» de trabalho, ou seja, uma espécie de aplicação didáctica por sebentas/receitas, conduzindo previsivelmente à desigualdade da sua aplicação, dada a heterogeneidade dos alunos e das turmas.

B) Os dados que presidem actualmente à implementação do processo de ADD apontam todos para falhas importantes que obstam a uma execução correcta.
1) Falta de suporte legal:
§ Inexistência do despacho de delegação de competências do Coordenador de Departamento noutro professor titular (n.º 2 do art.º 12.º);
§ Inexistência do despacho de indicação das ponderações dos parâmetros de classificação (n.º 2 do art.º 20.º);
§ Inexistência do despacho conjunto de estabelecimento de quotas (n.º 3 do art.º 21.º);
§ Inexistência da portaria que estabelece os parâmetros classificativos da avaliação a realizar pela Inspecção (n.º 4 do art.º 29.º);
§ Inexistência de informações sobre o posicionamento dos professores na carreira docente em virtude da aplicação do Novo Estatuto da Carreira Docente e do Decreto-lei nº 200/2007, mormente quanto à situação dos docentes situados nos últimos escalões da carreira de professor titular;
§ Inexistência de um Conselho Científico a quem competirá a formulação das recomendações para a avaliação dos professores (nº 2 do Artigo 6º). Este Conselho não foi constituído, havendo apenas quanto a essa matéria:
— O Decreto regulamentar nº 4 de 2008 de 5 de Fevereiro que o institui, e segundo o qual o Conselho deverá estar constituído no prazo de 60 dias a contar da data de publicação (ou seja, no início do 3º período);
— Uma presidente nomeada que emitiu recomendações no sentido de as escolas montarem um processo muito cuidadoso, negociado, assistido pela devida Formação e, sobretudo, fixarem as metas quantitativas, depois das próprias recomendações do conselho, dada a complexidade de todo o processo.

2) Falta de Formação:
§ O nosso Agrupamento já em Setembro inventariou esta necessidade como prioritária, tendo-a então comunicado ao Centro de Formação da sua área.
§ É notória a falta de oferta de formação sobre este tema, em todos os centros de formação próximos. A título informativo, referimos que a única formação sobre esta matéria conseguida por docentes da Escola Sede foi paga pelas professoras e implica o seu deslocamento a Sacavém…

3) Falta de dados básicos essenciais:
§ Uma avaliação do anterior sistema de avaliação de desempenho docente que aponte deficiências e forneça indicadores a ter em consideração na implementação deste.
§ A definição exacta do conceito de abandono escolar (muito diferente conforme se considerem os ciclos de escolaridade obrigatória ou o ensino secundário).
§ A definição exacta do que se pretende com melhoria dos resultados escolares e dos respectivos cálculos. Saliente-se que os últimos dados tratados e publicados datam de 2004/05 (IGE).
§ O próprio preenchimento das fichas não é claro, porque não estão definidos os respectivos critérios e ponderações; as quotas a atribuir não estão definidas.

4) Falta de condições mínimas relativas à organização interna da escola:
§ Não se vê como será possível agendar para o terceiro período, em simultâneo com toda a vida normal da escola, a assistência a aulas de professores contratados por professores avaliadores, que desde o início do ano lectivo têm que cumprir um horário completo normal.

Perante esta situação, que fazemos? Deixamos de funcionar na escola e abandonamos os alunos?
Para já, devemos sublinha que todo o tempo, energia e disponibilidade até hoje gastos para tentar montar este “aborto” organizativo se tem reflectido negativamente no trabalho normal da escola — foi feito à custa da qualidade das aulas e da atenção prestada aos alunos, sem falar do tempo roubado à vida pessoal dos professores.

5) Falta de condições de planeamento:
Não se entende como se faz cair, a meio do ano, numa organização como é este Agrupamento de 5 escolas, cujo planeamento se iniciou em Setembro (Projecto Curricular de Escola e PAA) e há dois anos (Projecto Educativo do Agrupamento), um conjunto de directivas e normas que alteram completamente as suas regras de funcionamento.

6) No que toca à Educação Especial:
· A situação é particularmente grave, já que se levantam questões, relacionadas com as práticas específicas destes professores, que não estão previstas nas fichas de avaliação, tornando impossível a sua aplicação.
· Acresce a esta situação uma legislação desarticulada e frequentemente contraditória, como se pode verificar pela perturbação trazida pelo decreto-lei nº 3/2008 de 7 de Janeiro, que dificulta gravemente qualquer orientação minimamente consistente em todo processo.

Resumindo: Estamos a arriscar as aprendizagens dos alunos, empenhando as nossas energias num projecto que nos prejudica como professores e prejudica a própria escola como organização.

C) Outros Dados:
Acrescentamos que o facto de recentemente ter sido anunciado pela Ministra e pelo SE Jorge Pedreira que os prazos intermédios de cumprimento impostos pelo Decreto Regulamentar 2/2008 de 10 de Fevereiro ficariam a cargo das escolas, em nada altera a decisão ministerial de a avaliação começar no 3º período (a valer pelo ano lectivo 2007/08…). Se a Senhora Ministra considera que esta questão da execução dos prazos é meramente «técnica», os professores agradeceriam informações técnicas para a sua resolução.

Assim sendo, o Conselho Pedagógico continuará o trabalho já iniciado de reformulação dos documentos de projecto do Agrupamento e de produção de instrumentos de recolha de dados para a Avaliação do Desempenho Docente, fazendo depender esse trabalho da resolução das situações irregulares atrás mencionadas e procurando nunca sacrificar a um tal processo o funcionamento da própria Escola e do trabalho com os alunos, dado que é essa, verdadeiramente, a nossa missão.

Considerando ainda que a maioria dos Departamentos subscreveu o texto abaixo transcrito, o Conselho Pedagógico entende comunicar a sua posição ao Conselho Executivo, à Assembleia de Escolas do Agrupamento, às Associações de Pais e Encarregados de Educação do Agrupamento/Escolas, à Câmara Municipal de Oeiras e ao Ministério da Educação.
Reservamo-nos ainda a liberdade de divulgar a nossa posição publicamente.
O Conselho Pedagógico do Agrupamento de Escolas de S. Julião da Barra - Oeiras, reunido a 13 de Fevereiro de 2008.

1 comentário:

FQ"inquieta" disse...

Ainda haverá dúvidas sobre a mercantilização do ensino, da educação, das escolas?
Aí está no seu melhor, o nosso alinhdo e militante governo neoliberal, com mais uma: PUBLICIDADE consentida nas escolas.A escola-empresa na calha.
De seguida virão os "sponsors" externos. A falta de recursos nas escolas e nas Autarquias trarão os próximos salvadores: os financiadores e seus condicionantes para quem uma escola hierarquizada e objecto duma política autoritária é carnufa p´ra canhão. Que bela aventura se aproxima! - (voltamos no próximo episódio)
Entretanto, tod@s à MANIF - 8 Março, 14.30h Marquês Pombal!!
FQ