sábado, 31 de maio de 2008







Por Antero Valério

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Ao que isto chegou


"É necessário criar nos jovens a ideia de que há oportunidades de formação muito além do prosseguimento de estudos que os qualificam para o mercado de trabalho. São escolhas de futuro cada vez mais valorizadas no mercado", afirmou Maria de Lurdes Rodrigues.

A titular da pasta da Educação acrescentou que o crescimento dos cursos profissionais tem vindo a ser consolidado com um conjunto de medidas, como o programa de bolsas, de estágios e a criação de uma plataforma que permite aproximar as escolas e as empresas, por exemplo.”

[Excerto da notícia da Lusa sobre o anúncio do grande crescimento de vagas nos cursos profissionais]

Qual é o próximo passo? Pôr os patrões a contratar directamente os formadores? Reduzir cada escola a uma fábrica de trabalhadores?
É a política da desistência perante a força do mercado. Desistência em mudar a realidade social e o peso da origem familiar. No país da União Europeia a 15 com a menor taxa de licenciados e com a mão de obra mais barata. Aplausos.

Miguel Reis

Escolas: Diversidade é o maior desafio


Os professores não são suficientes para lidar com as questões da diversidade sócio-económica e cultural nas escolas, sendo necessário um trabalho articulado com outros profissionais, defendeu hoje o presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), Júlio Pedrosa.

"Toda a gente sabe que não [que os professores não são suficientes para resolver o problema da diversidade]. A diversidade é a diversidade das pessoas e dos seus contextos. Muito frequentemente a escola precisa de outros profissionais a trabalhar fora da escola nesses contextos", afirmou Júlio Pedrosa, na abertura do seminário "A escola face à diversidade: percepções, práticas e perspectivas", que decorre no CNE, em Lisboa.

“[As escolas precisam] de assistentes sociais a trabalharem com as famílias, de sistemas de saúde articulados com a escola, da segurança social a dialogar com a escola sistematicamente. Quando falo em outros profissionais é dentro da escola, seguramente, mas também fora, a trabalhar com as crianças, com as suas famílias e os seus contextos familiares, para que na escola possam ter melhores desempenhos", acrescentou. (...)

Entretanto, o presidente do CNE considerou que o problema da diversidade é o "grande desafio que a escola tem há muitos anos e é porventura aquele que precisa de maior atenção" e acrescentou que "se pusermos este problema como uma grande prioridade da agenda política, das práticas educativas, com certeza vamos fazer progressos".

[Notícia da Lusa]

Comentário muito curto:

Que não se chame “problema” à diversidade. Preferimos “desafio” e “prioridade”.

O peso da origem


Foi recentemente revelado pelo Observatório de Trajectos dos Estudantes do Ensino Secundário (OTES) o relatório "Estudantes à Entrada do Nível Secundário de Ensino". O estudo contou com a colaboração de 11 estabelecimentos de ensino e a participação de 1806 alunos do 10.º ano ou equivalente, através de um questionário on-line, e faz uma caracterização pormenorizada do nível socio-económico, interesses, origens, etc dos estudantes que entram no ensino secundário.

Alguns dados já sinalizados pelo blogue ProfAvaliação:

- 9,1% dos alunos dizem não ter luz eléctrica em casa.
- 16,7% dos alunos dos CEF e 14,3% dos cursos profissionais afirmaram não ter luz eléctrica em casa
- Mais de metade dos alunos dos CEFs e dos cursos profissionais não tem computador em casa, situação que ocorre em apenas 36,4% das casas de alunos a frequentar a área científico-humanística.
- O nível de escolaridade dominante nas famílias dos alunos que frequentam os CEF é o 1.º ciclo do Ensino Básico (57,1%) e no caso dos cursos profissionais a percentagem aproxima-se dos 40%.

Acede aqui ao relatório completo

A "nova gestão escolar" está aí. Será que veio para ficar?


Há quem imagine que veio para ficar. Há quem receie que ela veio para ficar. Há quem tenha uma enorme esperança e tenha investido tudo para que ele fique. Mas há também quem saiba que ainda não chegámos ao fim da História, pelo que este "novo modelo de gestão" só irá mudar nas escolas aquilo que os actores quiserem que mude.

No preâmbulo do DL 75/2008 e no discurso político que justificou a sua publicação pode ler-se:

"Impunha-se, por isso, criar condições para que se afirmem boas lideranças e lideranças eficazes, para que em cada escola exista um rosto, um primeiro responsável, dotado da autoridade necessária para desenvolver o projecto educativo da escola e executar localmente as medidas de política educativa"

Esta frase, de uma singeleza tão absoluta, constitui todo um programa político e toda uma forma de entender as organizações em geral e a organização-escola em particular.
Para o governo do 1º ministro Pinto de Sousa liderar é mandar. Por isso precisa de saber quem manda, para poder cobrar a tal mandante a "execução local das medidas de política educativa"

Esta é uma visão da administração que nada tem a ver com descentralização e autonomia. Pelo contrário, trata-se de desconcentrar para a periferia a responsabilidade pela execução das medidas que são pensadas, planeadas e decididas centralmente. É sem dúvida uma visão napoleónica, imperialista e centralizadora. Que para ser aplicada com eficácia necessita de recorrer a um sistema de prémios e castigos, que mantenha sob controle toda e qualquer tentativa de dissidência.

Foi esta visão que produziu casos como o caso DREN vs. Charrua no Ministério da Educação, ou a substituição na direcção num Centro de Saúde ocorrida no Ministério da Saúde.

Mas ao contrário do que a cultura tecnocrática e pouco sustentada do ponto de vista teórico do nosso 1º Pinto de Sousa pode imaginar, as organização não podem ser entendidas apenas como máquinas ou como burocracias hierarquizadas. No caso específico das escolas, a lógica de trabalho cooperativo que está subjacente à função docente (no melhor interesse do aluno), está em
contradição absoluta com a ideia de hieraquização organizacional. É por isso que a ideia de instituir um "líder forte", a quem se imputam as responsabilidades de fazer cumprir ordens exteriores à organização, está condenada ao fracasso.

Numa sociedade democrática, em que os cidadãos têm teoricamente o direito a ter opinião, tomar decisões e a ser tratados como iguais, não se pode pedir a uma classe profissional (ainda por cima quando esta tem qualificações académicas de grau superior) que abdique desses direitos e se mantenha de boca fechada, fazendo exclusivamente o que lhe for ordenado e submetendo-se às regras impostas pelo "líder forte". Não se pode esperar que um grupo social que tem no seu seio, exclusivamente, pessoas com formação ao nível de licenciaturas ou estudos pós-graduados, se esqueçam de exercer os seus direitos de cidadania durante 35 horas por semana e continuem a trabalhar alegremente.

Quem assim pensa bem pode começar a preparar a reconstrução da FNAT e dos serões para trabalhadores!!!

[retirado do blog de FJSantos: http://fjsantos.wordpress.com]

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Vamos boicotar o diploma de gestão?


Apelo do blogue ProfAvaliação:

“Nos termos do disposto do decreto-lei 75/2008, a não criação do conselho geral transitório impede, na prática, a aplicação do novo modelo de gestão, pois seria o Conselho Geral Transitório a promover os procedimentos que levariam à selecção do futuro director.

Se os professores boicotarem a constituição do conselho geral transitório num número significativo de escolas, estarão a dizer ao país que discordam do novo modelo de gestão escolar. Serão capazes de fazer isso? Nas escolas onde haja um ou mais candidatos a director com um perfil democrático e tolerante, pode justificar-se a apresentação de listas de docentes ao conselho geral transitório. Nas outras, a estratégia da não apresentação de listas parece mais eficaz.”

Apelo do SPN:

Tal como vem acontecendo em várias escolas de todo o país, terminado o prazo aberto na Escola Secundária António Nobre, no Porto, para apresentação de listas candidatas ao Conselho Geral Transitório previsto no artigo 60.º do Decreto-Lei n.º 75/2008 de 22 de Abril, não teve lugar a apresentação de qualquer candidatura ao órgão em causa. (...)

O SPN, desde o início muito crítico deste novo modelo, saúda os docentes desta escola e aproveita para renovar o apelo a que em cada escola e agrupamento se evitem as precipitações e que sejam muito bem discutidas todas as implicações deste novo modelo, na certeza de que muitas mais decisões deste tipo irão, naturalmente, surgir.

Apelo do SPZS/Fenprof:

1.O memorando de entendimento e o despacho interno de 30 de Abril estabelecem que o prazo previsto no nº 1, do artº 62 do DL 75/08 é alargado até 30 de Setembro’08. Ou seja, o que legalmente naquela data deve estar concluído são os procedimentos necessários à eleição do Conselho Geral Transitório. Não é o conselho que deve estar eleito, mas apenas desenvolvidos os procedimentos necessários a esse processo de eleição – pode dizer-se que 30 de Setembro é a data para afixação do edital que convoca a eleição.

2.O desenvolvimento destes procedimentos é da competência do actual Presidente da Assembleia de Escola/Agrupamento.

3.A FENPROF está a apelar aos Presidentes da Assembleia no sentido de que só desenvolvam aquele processo em Setembro e que não o façam neste ano lectivo (foi remetida carta a todos). A FENPROF tem esta opinião porque entende que a passagem desta questão para o próximo ano lectivo alarga as possibilidades de combate ao modelo autocrático de gestão que o ME quer impor. A FENPROF não tem discordâncias pontuais com o modelo do ME – a FENPROF discorda da filosofia e das opções que lhe servem de base, isto é, discordamos de todo o modelo.

4.A FENPROF entende que, se a generalidade dos professores discordam do modelo do ME (DL 75/08), não têm razão nenhuma para ter pressa em o aplicar. Não têm razão para ter pressa nem a isso são obrigados.

5.É, aliás, estranho (no mínimo) que alguns colegas, nomeadamente de órgãos de gestão, tenham mais pressa que a própria Ministra da Educação – o ME fixa o prazo de 30 de Setembro, mas alguns (“mais papistas que o papa”) querem desenvolver o processo ainda este ano lectivo …! É caso para perguntar: o que os move ?

6.A FENPROF apela também aos professores para que, agora ou em Setembro, não apresentem listas para a eleição do Conselho Geral Transitório. Apelamos também a que, junto dos trabalhadores não docentes, se tente evitar a apresentação de listas.

7.Perguntar-se-á: que efeitos pode ter a não existência de listas ?

7.1 Em primeiro lugar, deve dizer-se que, com um elevado número de escolas e agrupamentos sem professores eleitos para o Conselho Geral Transitório, o ME fica a braços com um grave problema político e de contestação às suas opções. O que acontecerá nessa situação, ninguém pode saber, nesta altura. O tempo dirá se, a partir de tal situação, o combate ao modelo pode ganhar novas energias.

7.2 No plano formal deve recordar-se que o ponto 8, do artº 60º, do DL 75/08, estabelece que “ o Conselho Geral Transitório só pode (…) deliberar estando constituído na sua totalidade”. Ou seja, sem que se realize a eleição dos seus membros docentes, aquele conselho não pode decidir nada. Encontrará o ME uma solução para tal problema ? Talvez sim. Mas a luta dos professores também saberá encontrar caminhos para combater o modelo que o ME quer impor.

8.Importa dizer ainda que, no plano legal, nenhum problema disciplinar ou outro decorre do facto de um Presidente da Assembleia desenvolver os procedimentos previstos no DL 75/08 no final do mês de Setembro’08.

9.Não fazer listas para a eleição do Conselho Geral Transitório é um contributo para continuar a luta na defesa da democracia na direcção e gestão das escolas. Não é a solução final e definitiva para acabar com o modelo que o ME quer impor, mas ajuda num combate que os professores e as escolas vão ter que continuar a travar. A FENPROF estará na primeira linha deste combate.

10.O SPRC e a FENPROF apelam ao empenhamento de todos os Delegados e Dirigentes Sindicais no sentido de contribuírem para evitar:
1. o desenvolvimento do processo conducente à eleição do Conselho Geral Transitório, este ano lectivo;
2. a existência de listas (de professores e de trabalhadores não docentes) candidatas àquele concelho.

A Direcção do SPZS .FENPROF
(21.Maio.08)

Até onde exigir, até onde nos ser exigido

Imagem de Barcouço (Portugal)

O que pode fazer a escola? Até onde se lhe pode exigir ?

O que pode fazer a escola?
Continuar a fazer aquilo que sempre fez, aquilo para que foi inventada, aquilo que só ela faz, aquilo que mais nenhuma instituição pode fazer, aquilo que, se a escola fechasse as suas portas, deixaria absolutamente de ser feito. Que ensine as nossas crianças, que lhes permita, em 12 anos de escolaridade gratuita e obrigatória, e, de preferência, em mais quatro ou cinco anos de formação superior, adquirir os conhecimentos fundamentais que a humanidade foi lentamente construindo, as teorias explicativas básicas necessárias à compreensão geral do mundo em que vivem e dos seres que o habitam, as suas determinações históricas, filosóficas e artísticas mais decisivas, um domínio alegre e satisfatório da sua língua, outras línguas e outras maneiras de ver o mundo, destrezas físicas e intelectuais, ginástica dos corpos e dos espíritos. Transmitir tudo isso sem impor morais, sem apontar modos de vida, sem sugerir cenários de felicidade na Terra ou fora dela (1).

Até onde se lhe pode exigir ?
Duas exigências apenas. Primeiro: Que esteja atenta às transformações no mapa dos saberes, que se dê conta dos novos territórios, das novas rotas, do alargamento dos horizontes científicos, do cruzamento das paisagens culturais, mas também dos lugares de conflito, das encruzilhadas, das dificuldades, das fronteiras em que hoje se concentram verdadeiros enxames interdisciplinares. Que, por essa razão, e na medida das suas possibilidades, actualize os seus programas, adapte e reconstrua os seus curricula, continuando a preparar tanto para as ciências como para as humanidades, procurando contrariar os efeitos perversos da especialização crescente dos saberes, que abra espaço às novas disciplinas científicas, responda aos novos deslocamentos cognitivos, que favoreça as heurísticas resultantes dos novos cruzamentos disciplinares, que se faça eco das importantes transformações civilizacionais em curso. Que, nesse sentido, prepare as nossas crianças para o domínio dos novos meios de comunicação e para a exploração da quantidade gigantesca de informação já hoje disponível dando-lhe aquilo que mais nenhuma instituição pode fornecer: uma cartografia de navegação no turbulento oceano do saber.

Segundo: Que garanta que esse acto de comunicação e construção cultural que ela tem como missão, isto é, que o ensino que só ela faz, que nada nem ninguém poderia fazer sem ela, que seja bafejado de toda a beleza possível. Que a palavra que primordialmente o constitui seja tomada de fulgor explicativo, mostrativo, demonstrativo, na sua vontade de "dar a ver", de iluminar para que o outro veja.
Revalorização também da figura do professor como aquele que re-presenta o saber, que o a-presenta, que o torna presente, que o vivifica com a sua presença. Não como repetidor mas como executante de uma sinfonia de luz, cor e inteligência.

E nós, que podemos fazer? Que nos pode ser exigido?
Continuar a acreditar que o belo é o esplendor da verdade. E comover-nos com isso.
(1)“Na escola, como queria Neil, temos que nos recusar a transmitir "religião, política ou consciência de classe”, Liberdade sem Medo, p. 105. Nas palavras de Hannah Arendt, "A função da escola é ensinar às crianças o que o mundo é e não iniciá-las na arte de viver", A Crise da Educação, p 51.


Olga Pombo (2003) O insuportável brilho da escola,

in Alain Renaut et allii, Direitos e Responsabilidades na Sociedade Educativa,
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 31-59.
(selecção, cores e destaques nossos)

terça-feira, 27 de maio de 2008

Participação


Era uma reunião do conselho de turma que, pensávamos, não iria ser fácil. Não se pensava que fosse correr facilmente. Mas vimos depois como tudo podia ser ainda um pouco mais difícil.
Estavam presentes todos os professores, um representante dos pais, um representante dos alunos e, naquele caso, também a psicóloga da escola. A turma era complicada sobretudo porque havia uma forte interacção entre todos os alunos. Tinham vindo quase todos da escola pré-primária, depois da escola de 1º ciclo. Estavam agora no segundo ciclo e a relação entre eles era mais forte que a relação com um contexto organizacional que ainda não dominavam completamente. Afinal tinham estado juntos em 70% das suas ainda pequenas vidas.

A disciplina de História era a que apresentava maiores dificuldades. Uma grande tensão estava sempre presente na relação entre o professor e aquele grupo de alunos que tinham entre os 10 e os 12 anos; eram observadores, perspicazes, críticos e por vezes um pouco trocistas quando as coisas não corriam bem. Cheios de sentido de humor, habituados a exprimirem-se à vontade e, sobretudo, solidários e exigentes; não deixavam que as respostas que lhes dávamos fossem pouco completas e não passavam sem fazer de novo outra pergunta sempre que não estavam convencidos.

Às vezes pareciam as crianças que repetem interminavelmente o seu “mas porquê?”. E isso enervava-nos um pouco e requeria alguma paciência. Era uma turma pouco homogénea mas com uma identidade muito própria. Na aula de História, por qualquer motivo, desenhou-se uma relação de pouca empatia e os conflitos estavam sempre a aparecer.

Na reunião íamos discutir várias questões e guardámos a questão dos problemas na aula de História para o fim. Quando, depois de muitas intervenções, muitas queixas da professora, observações de alguns pais, se pretendia encerrar a reunião, o Marco levantou o dedo:
— Posso dizer uma coisa?
— Claro, disse a directora de turma que presidia à reunião.
— É que nós achamos que é verdade que somos um bocado mal comportados mas isto tem muito a ver com o stor M.
— Que queres dizer?
— É que nós também temos algumas queixas a apresentar… porque se o stor…
E, com voz calma, o Marco foi apresentando as suas razões, dizendo sempre nós (referia-se a todos os colegas da turma). Gerou-se um momento um pouco constrangedor mas escutou-se o Marco.
No final alguém chamou o Marco e lhe disse:
— Fiquei muito chocada com o que fizeste. Não esperava isso de ti.
— Mas o quê stora?...
— Falares daquela maneira na reunião, do teu professor de História…e ainda por cima diante do representante dos pais…Não esperava isso de ti, tão educado… nem parece teu, falares assim diante dos outros, diante de pessoas de fora…
— Mas eu estava ali a representar os meus colegas, tinha que dizer o que a turma me pediu para dizer… Não era o que eu tinha que fazer?

Sim, era o que o Marco tinha que fazer. Ele era o representante dos alunos, ele participava e defrontava com alguma dificuldade o terreno desconhecido de uma reunião formal, o mundo dos adultos, o olhar do próprio professor a quem os alunos questionavam algumas atitudes. Falava com frontalidade e equilíbrio, apresentava aquilo para que os colegas o tinham mandatado.
O Marco cumpria assim um dever de cidadania e reclamava o seu direito de participação. Mas não foi felicitado por isso. Deve participar, diz-se. Mas a participação pode ser um difícil exercício.

Angelina Carvalho
Colaboradora do CIIE da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação

Artigo da edição de Maio do Jornal A Página da Educação

Poucos direitos


Portugal é o País da União Europeia em que a percepção dos jovens sobre a protecção dos direitos das crianças é mais negativa. A maioria dos jovens portugueses (59 por cento) considera que os direitos das crianças não estão devidamente protegidos no País. As conclusões são de uma sondagem Eurobarómetro, ontem divulgada em Bruxelas, feita junto de jovens entre os 15 e os 18 anos, que coloca Portugal a um nível próximo do da Roménia.(...)

Os jovens portugueses voltam a distanciar-se da média quando questionados sobre as áreas prioritárias para defender os direitos das crianças. A educação é apontada por 90% dos portugueses (74% na média da UE), seguida da saúde e acção social, apontadas por 73%. Essa preocupação é manifestada por apenas 40% dos jovens na UE.

Vê aqui a notícia toda

Por Antero Valério

Em busca do contexto


1. Em redor, por detrás, antes e depois dos eventos e do espectáculo, existe o contexto. Cada vez estamos mais deficitários de contexto. Vai sendo tempo de furar a espuma dos dias e começar a entender a rapariga do telemóvel, ultrapassando o acontecimento e as imagens que se tornaram icónicas e que já não nos pertencem, circulando loucas na hiperrealidade do ciberespaço, entrando no imaginário colectivo e criando efeitos na realidade. A rapariga do telemóvel não é uma criminosa. É uma jovem no limiar do século XXI e não apenas uma estudante. É alguém moldado por pressões socializadoras múltiplas e contraditórias, em que a família e a escola perderam grande parte do seu poder normativo e de enquadramento.

Incapazes, os media, os magistrados e alguns sindicatos, de perceberem que nada se resolve com a punição criminal ou com mais da mesma escola (a tal que está em crise). Mas sem dúvida que algo poderia mudar se, por exemplo, as escolas públicas, os professores e os sindicatos se comprometessem a combater todas as práticas de recrutamento selectivo de jovens, as tais que escolhem os discentes de origens sociais favorecidas, de molde a obterem melhores resultados, capazes, assim, de catapultarem as escolas no famigerado ranking. Ou a segregação em turmas, concentrando, tantas vezes, os alunos com piores classificações, insucesso e vulneráveis ao abandono.

2. SIC-notícias: puxar o sangue. Reportagem sobre os horrores nas escolas públicas e as virtudes da serena e firme harmonia das privadas onde os telemóveis não entram. A seguir, um debate a quatro. Uma senhora historiadora, reaccionaríssima, atribuía o fenómeno ora à falta de educação dos pais dos alunos da geração da massificação, ora à psicanálise e às ciências sociais que desresponsabilizaram o indivíduo por se preocuparem com as causas estruturais. Afinal, a escumalha invadiu as escolas e por isso exigia a expulsão e um ano de trabalho comunitário para a aluna-criminosa. Outra senhora, jornalista e neoconservadora orgânica, um pouco mais polida, lamentava a ausência de um contínuo que tirasse o telemóvel à aprendiza, pois os funcionares menores (nos liceus de Salazar havia sempre a salita do «pessoal menor»…) devem servir como exército ao serviço dos senhores professores, espécie de casta intocável que jamais se pode permitir ao mais leve contacto físico com os alunos. Chamava a atenção, ainda, para o respeito que existia nas escolas dos antigos países «comunistas». Que saudades da pura força. Ambas eram traídas pela paralinguagem: o timbre, a dicção, o sotaque de classe de senhoras burguesas com formação intelectual. Um terceiro, jornalista de «topo», em recaídas de riso
ligeiramente boçais, falava da autoridade e da falta que fazem os campos de futebol para sugar as energias destrutivas dos alunos. Um quarto interveniente, Rui Tavares, jogava à defesa.

O Senhor Procurador-Geral da República, entretanto, perdeu a cabeça e accionou uma intervenção de direito criminal sobre a aluna, envolvendo medidas cautelares e uma eventual condenação pelo tribunal de menores. Mário Nogueira, da FENPROF, perdeu não menos cabeça ao aplaudir o primeiro. Quero dizer a todos estes senhores e senhoras que as classes perigosas estão nas escolas, nos bairros e nas cidades para ficar. Quero dizer-lhes que todos os dias aumentam os seus caudais. Quero afiançar-lhes que as explosões sem sentido, raivosas, inconsequentes e barulhentas, eclodirão um pouco por toda a parte. Quero garantir- lhes que o espaço público está a ser destruído e que, um dia, só lhes restará viver em estado de sítio permanente, em bolhas militarizadas de apartheid urbano e vertigem securitária. Quero sossegá-las porque não será a revolução. E construir-se-ão muros e paisagens blindadas. E haverá prisões em cada freguesia. E hordas de adolescentes perecerão em campos de concentração, depois de gritarem mil e um palavrões horrendos. Ou então…

João Teixeira Lopes
Sociólogo, Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP)

Artigo da edição de Maio do Jornal A Página da Educação

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Fórum Mundial da Educação


Vai decorrer, de 28 a 31 de Maio, na cidade de Santa Maria, no Estado do Rio Grande do Sul, Brasil, o próximo Fórum Mundial de Educação. Subordinado ao tema de «Educação: Economia Solidária e Ética Planetária», esta edição do FME pretende relacionar o papel da Educação nas acções de transformação social com a participação activa dos cidadãos em prol da justiça e da paz.

Consultar:
www.forummundialeducacao.org/rubrique54.html

Quantos professores deve ter um aluno?


Desenho de Antero Valério

A simpatia do Ministério da Educação pelo professor único no 2º ciclo arrisca-se a pauperizar a qualidade do ensino. Isto porque a ministra já nos habituou às suas medidas tipo retro-escavadora que escavaca e atropela tudo e todos. Não seria de admirar que ela fosse movida apenas por mais uma oportunidade de reduzir o número de professores e poupar mais uns cobres no ensino público. Porque sobre a outra recomendação do Conselho nacional de Educação em relação à falta de cobertura pública das crianças entre os 0 e os 3 anos ainda não se lhe ouviu uma palavra. Por outro lado, se as boas práticas parecem recomendar que é prejudicial um número excessivo de professores no 2º ciclo, também é verdade que a monodocência no 1º ciclo é redutora e amiga da privatização de vastas áreas do currículo.

Sobre esta polémica, recomendamos a leitura do seguinte post de Ramiro Marques, em ProfAvaliação:

"Desde 1990, que as escolas primárias de Espanha contam com mais do que um professor na sala de aula. Para além do professor titular da turma, os alunos contam com a presença de um professor especializado no ensino do Inglês, outro especializado em ensino da Música, um outro em Educação Física e outro em Religião. Em certos casos, há também o apoio de um professor especializado no ensino das Ciências. Desde 2004, que 150 centros escolares da Comunidade Autónoma de Madrid introduziram o bilinguismo na escola primária com ensino simultaneamente em Castelhano e em Inglês.

Em Portugal, devíamos optar pela mesma solução. Em vez da inclusão do Inglês nas AEC, devíamos introduzi-lo na componente lectiva. O mesmo se terá de fazer com a Música e com a Educação Física. Se alguma modificação há a fazer é a introdução do Inglês, da Música e da Educação Física na componente lectiva do 1º CEB. No 2º CEB, não vale a pena mexer. O dispositivo actual permite a diminuição da dispersão curricular. Basta que as Ciências e a Matemática sejam leccionadas pelo mesmo professor. E o mesmo para o Português e a História."

Escolas têm um psicólogo por quase dois mil alunos


«As escolas públicas portuguesas têm um psicólogo por uma média de 1986 alunos [...]. O Sindicato Nacional dos Psicólogos lembra que o rácio recomendado pelo Conselho Nacional de Educação é de um psicólogo por 400 alunos, e que há profissionais com "dezenas de escolas a seu cargo".» In Público (23/5/08)

Onde está a vontade de combater o insucesso escolar? Onde está a vontade para gastar dinheiiro bem gasto, apretechando as escolas com equipas multidisciplinares para evitar o insucesso e o abandono? O que vemos e ouvimos é a ministra a queixar-se que cada chumbo custa muito dinheiro ao Estado...

Comissão Paritária

A Comissão Paritária para acompanhamento da implementação da avaliação de desempenho dos professores reuniu no dia 23 de Maio, em Lisboa. Os sindicatos denunciaram várias irregularidades.

Vê no site da Fenprof e no site da FNE as conclusões desta reunião.

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Escolas não se dirigem às crianças pobres


Entre 1995 e 2000, 52,4% dos agregados familiares viveram pelo menos um ano numa situação vulnerável à pobreza. A conclusão é do estudo coordenado por Alfredo Bruto da Costa, a publicar em Junho, mas que vem hoje com grande destaque no Público.

Transcrevemos aqui uma pergunta/resposta da entrevista feita a Alfredo Bruto da Costa, para reflectirmos e opinarmos:

P - O estudo fala no cilco vicioso da pobreza: o pobre tem baixas qualificações e não as melhora porque é pobre. Como romper?

R - Uma das respostas é que o sistema educativo tem que ter condições de acesso e sucesso das crianças provenientes dos meios mais pobres. O sistema educativo está desenhado à semelhança da família média e média alta: métodos pedagógicos, conteúdos, o apoio que a criança pode ter em casa....

As mesmíssimas


Na semana em que a ministra da educação deu a sua entrevista à TVI também Manuela F. Leite, canditata a líder do PSD foi à RTP. A questão era a chamada “avaliação” que o ministério quer impor contra a vontade da esmagadora maioria do pessoal docente e que criaria um insustentável prejuízo da qualidade do trabalho das escolas. Perguntada se tomaria as mesmas medidas que o actual governo, a candidata do PSD respondeu rápida e categórica : “As mesmíssimas”.

Questionada hoje pelo jornal Público sobre quais são os serviços públicos que ainda podem ser privatizados, Manuela F. Leite não hesita em colocar a Educação nessa lista. A “sociedade civil” e o “mercado” que tratem do assunto.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Avaliação e professores na Europa


Mais um documento comparativo que dá que pensar....

Vê no blogue Terrear:

Comissão Paritária reúne esta Sexta


Veremos o que daqui resulta, até porque há muitos Conselhos Executivos a fazer bem mais do que a tal avaliação simplificada....

Transcrevemos o e-mail do site da Fenprof:

"A Comissão Paritária para acompanhamento do processo de avaliação do desempenho dos docentes, criada no âmbito do "Memorando de Entendimento", subscrito pela Plataforma Sindical dos Professores, reúne na sexta-feira, dia 23, a partir das 10.30 horas, nas instalações do CNE.
Nesta reunião, a FENPROF colocará um conjunto de situações problemáticas que estão a surgir em algumas escolas que tentam aplicar procedimentos absolutamente inaceitáveis, quando está decidido e previsto em lei que estes deverão ser simplificados e uniformizados. As situações que serão apresentadas, e para as quais se exigirão soluções que respeitem o entendimento estabelecido e os quadros legais que dele resultaram, chegaram ao conhecimento da FENPROF através do "Mail Verde" criado precisamente com este objectivo.

Desde a adopção de grelhas extremamente complexas, a observação de aulas, entrevistas e outros procedimentos que deveriam ter sido abandonados na sequência do "Memorando de Entendimento", escolas há que decidiram tornar complexo o que deveria, deverá e terá de ser simples. A FENPROF não pactuará com essas situações, exigindo do ME e das escolas o respeito pelos professores!

O Secretariado Nacional da fenprof
21/05/2008"

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Inglês à rasca


Enquanto o governo faz propaganda do Inglês no 1º ciclo, prometendo até estendê-lo ao 1º e 2º ano, vão-se descobrindo as carecas.
Gastar dinheiro com a escola é sacrilégio. Por isso, o Inglês continua fora do currículo obrigatório, mantêm-se os 100 euros por aluno a dar às câmaras municipais (nem mais um cêntimo), e continua a precariedade e os recibos verdes de quem vai dando aquelas aulas, umas com boa qualidade, mas outras inevitavelmente com falta dela.

Autarquias sem dinheiro para Inglês no 1º ciclo

Grau zero da estabilidade docente: milhares de professores das "AEC" pagos a recibo verde!

terça-feira, 20 de maio de 2008

Viva a Primavera!

O moralismo/conservadorismo/puritanismo de alguns Conselhos Executivos cada vez torna mais visível a urgência de Educação Sexual a sério nas escolas. Ou será que os alunos, nessa matéria, terão que esperar pelos conselhos do Senhor?

Ainda os critérios Fatais...


Testemunho 1

"Sou Coordenadora do Departamento de (...) . Quando o processo de avaliação dos professores começou nós, os coordenadores, fomos desenvolvendo o trabalho que possibilitasse a avaliação dos docentes e desenvolvemos uma proposta que submetemos a toda a escola (...).
Contudo, a Presidente do CE, que apenas reuniu connosco uma vez, no início do processo e nunca convocou o Conselho Coordenador da Avaliação (de que faço parte), resolveu encomendar o processo de avalação a um tal Dr. Jorge Fatal – que eu já conhecia, uma vez que tinha tentado fazer vingar na escola (...) foi simplesmente recusado.
Pois bem, o sistema que nos propõem baseia-se em observar um elevado número de condutas (o Dr. Fatal diz que o seu sistema funciona bem se forem cerca de 120 condutas) às quais os avaliadores respondem simplesmente S/N, havendo um algoritmo que depois cruza com Atitudes, Competências e Objectivos das quais sai uma avaliação.
Até ao momento não foi possível perceber como esse cruzamento é feito embora o Dr. Fatal diga que nos compete a nós definir as condutas e os pesos relativos. Contudo, diz também que não divulga o seu sistema de modo completo a não ser que assinemos um compromisso de confidencialidade.
Ora, a Presidente do CE quer que os Coordenadores adoptem a Grelha do Fatal, definam as tais condutas e depois apliquem o seu método. Eu confesso-me muito preocupada por discordar totalmente da metodologia proposta e, ao mesmo tempo, zangada, por ver ser simplesmente deitado fora o nosso trabalho de longos meses. Além disso, não posso perceber como desenvolver um método de avaliação em que se pede confidencialidade (confidencialidade num processo cuja transparência é um elemento essencial?), do qual não nos é dito como, em última instância, são avaliados os parâmetros do ME. Para já, o que conhecemos é a proposta que a Presidente nos apresentou com 96 condutas com que nos quer avaliar.
Desculpe o trabalho que lhe estou a dar mas não posso deixar de lhe apresentar essas condutas (...) porque é o que a Presidente se propõe usar. Que é isto? Como é que isto se transforma na avaliação? Não nos dizem."

Testemunho 2
"A outra coisa é que anda a ser divulgado (na minha escola, pela presidente do CE) um email da DREN em que se anunciam cursos no INA, da responsabilidade do Dr. Fatal, destinado a treinar avaliadores. Parece que serão cursos pagos, embora o anúncio da DREN não o previna. Ora, isto é muito estranho e preocupante: uma delegação do ME anuncia cursos dados por um senhor que treina pessoas de escolas às quais, depois, vai tentar vender um programa? Embora eu acredite que não há aqui um conluio, há sim uma desatenção e falta de informação que não deveria acontecer, não acha? "

Vê aqui a lista de critérios Fatais

Por Antero Valério, no anterozóide

Estudo do CNE defende fusão do 1º e 2º ciclos


“Um estudo do Conselho Nacional de Educação (CNE) recomenda a fusão dos 1º e 2º ciclos do ensino básico para acabar com «transições bruscas», com apenas um professor, progressivamente apoiado por outros docentes em pelo menos duas áreas uma mais voltada para as ciências e outra para as letras. (...)

«Este modelo permitiria articular a exigência da competência disciplinar face ao crescente desenvolvimento do conhecimento sem relegar para um plano secundário a importância do vínculo pedagógico, da relação de pessoalidade e do conhecimento interpessoal que a actual organização do ensino desestabiliza com a entrada do aluno no 2º ciclo do ensino básico», lê-se no documento. O aluno passa de uma escola de pequenas dimensões e uma sala única, «onde tudo é próximo e familiar», para uma escola de tamanho médio com aulas em salas diversificadas, com uma organização dos tempos mais rígida, onde cada disciplina existe como um compartimento de saber.

«O contraste acentua-se ainda pela diferença de cultura profissional entre os professores do 1º ciclo e do 2º ciclo. Enquanto que os primeiros se assumem como professores de crianças cuja missão se centra na promoção de aprendizagens fundamentais por parte dos alunos, os segundos assumem-se primeiramente como professores de uma disciplina escolar», lê-se no estudo.
«Ou seja, para os primeiro o que interessa é que os alunos aprendam, enquanto que para os segundos o que interessa é que a sua disciplina seja aprendida. Para os primeiros o foco são os alunos, enquanto que para os segundos o foco é a disciplina escolar», acrescenta.

O documento recomenda ainda o alargamento dos apoios destinados às crianças dos zero aos 03 anos de idade, a profissionalização das amas, uma melhor oferta de ocupação de tempos livres e uma articulação entre serviços sociais e serviços educativos que «ultrapasse a tradicional associação de serviços de carácter social às populações mais carenciadas e de serviços educativos às mais favorecidas». Aliás, «desarticulação» é a palavra mais usada pelos autores do estudo para resumir as «áreas problemáticas» da educação das crianças dos zero aos 12 anos, por exemplo entre as políticas que influenciam a vida das crianças: saúde, segurança social, educação, família, emprego, etc.

Vê aqui a notícia completa do Sol/Lusa

Lê o estudo todo, publicado no site do CNE

Comentários breves:

1) A fraca taxa de cobertura pública em creches e jardins de infância é um dos pontos enfatizados pelo documento. O governo dará ouvidos a esta questão?

2) A ideia principal do estudo não é de desprezar e merece ser tida em conta. Há realmente uma transição brusca do 1º para o 2º ciclo, apesar dos disparates que o estudo refere sobre os professores que se interessam pelos alunos e os que só se interessam sobre a disciplina.

3) É clarinho como água que o Ministério queira agarrar as propostas que lhe fazem poupar uns cobres. Reduzir o número de professores é a ideia mais tentadora e bem ao jeito deste governo. E não se pode estender algumas ideias da monodocência para o 2º ciclo, mas com uma rede multidisciplinar que acompanhe individualmente os alunos com mais dificuldades e apostando em turmas mais pequenas? E que tal ter também estes apoios e equipas no 1º ciclo, que não deve ser reduzido à actividade de um só professor? Porventura, para isso, bem como para o alargamento da cobertura de creches, falarão mais alto outros intere$$e$.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Estudo valoriza turmas pequenas e heterogéneas


Ensinar crianças do 1º CEB em grupos de nível não aumenta o seu desempenho e pode prejudicar os alunos que são distribuídos pelos grupos que têm mais dificuldades de aprendizagem.

Esta foi a conclusão de um estudo feito por investigadores do Instituto de Educação da Universidade de Londres e do King`s College sobre a educação primária no Reino Unido. Os alunos brilhantes têm um desempenho excelente quer estejam em grupos só com alunos brilhantes ou em grupos mistos.

O estudo concluíu que os alunos aprendem mais quando estão em turmas pequenas. Os alunos com mais dificuldades são os mais prejudicados com as turmas grandes. Os autores do estudo recomendam que as turmas tenham menos de 25 alunos.

Este importante estudo contraria quer a política do Governo de Gordon Brown quer dos Tories, na oposição. Tanto o Governo britânico como a oposição conservadora têm vindo a exigir a generalização de grupos de nível como uma estratégia para melhorar o desempenho dos alunos e os níveis educacionais. No Reino Unido, cerca de 28% das escolas primárias organizam grupos de nível na Matemática. O estudo conclui que são poucos os alunos que mudam para grupos de nível superiores. A distribuição dos alunos por grupos de nível a Matemática e a Inglês é feita de acordo com os resultados nas provas nacionais.


Leia o resto no Independent Online.


Publicado por Ramiro Marques em ProfAvaliação

Em Setembro há mais e melhor


Esta foto da manifestação de 17 de Maio em Lisboa, é a melhor que se arranjou para dar a ideia que não éramos assim tão poucos.

Juntando Lisboa, Porto, Coimbra e Évora, foram pouco mais de três mil os professores que sairam à rua. Na verdade, nem sindicatos, nem movimentos, nem ministério, ninguém esperava muito mais gente. Mesmo assim, foi melhor ter acontecido. Houve notícias boas (nas Tvs, na imprensa escrita nem por issso) e permite manter alguma coisa acesa, permite dizer que estamos vivos e não desistimos.

É verdade que o entendimento alcançado desmobilizou milhares de professores. Fica por contar o que teria acontecido caso o entendimento não tivesse sido assinado. Sobre isso uns dirão que a luta ia explodir, e que dezenas de milhares de professores e inúmeras escolas iam parar o processo de avaliação, viriam para a rua e obrigariam à demissão da ministra ou a um recuo mais significativo. Outros dirão que o processo de avaliação avançaria com toda a força na maioria das escolas e que nenhuma pequena vitória teria sobrado da grande manifestação de 8 de Março.

Mas houve aqui um equívoco. É que tendo-se mantido estas concentrações e manifestações regionais pós-entendimento, elas nunca podiam ter sido encaradas como “plenários para explicar o entendimento aos professores”, ou “para cumprir calendário”, mas sim como as únicas formas de fazer o governo recuar mais, muito mais. Os sindicatos tiveram medo. Receio de ter pouca gente, de ter pouca força. Mas se estavam marcados os protestos, eles deviam ter sido convocados com mais força e menos timidez. A ideia de que era preciso continuar a lutar ainda este ano lectivo não passou. A malta quis descansar e enganou-se. Em Setembro tem que ser a valer e a doer.

Miguel Reis

sábado, 17 de maio de 2008

Beja 2008 Educação Artística (português, espanhol e portunhol)


Sentidos Transibéricos
Congresso Ibero-Americano de Educação Artística
Beja, Portugal, 22, 23 e 24 de Maio de 2008

Reune especialistas em Educação Artística do espaço ibero-americano, oriundos de cerca de 40 instituições de Ensino Superior ou com responsabilidades na área da Educação.

Tem como principais focos de reflexão os aspectos teóricos e práticos ligados ao papel da Educação Artística/Arte/ Educação na construção de identidades dos jovens nas sociedades contemporâneas, na cultura do multimédia, na e-geração, na diversidade cultural, nos problemas da inclusão/exclusão social, na preservação de patrimónios, na educação para a paz e para a sustentabilidade.

Mais informação: http://www.rede-educacao-artistica.org/congresso-ia.htm

Também há Congresso on-line, oportunidade para quem não tem autorização do patrão para se formar neste calendário presencial.

Braga, 2008 Vozes Universitárias (Galiza, Portugal, Brasil)

Mais informação: http://www.edicoespedago.pt/noticia.asp?idEdicao=53&id=1815&idSeccao=520&Action=noticia

sexta-feira, 16 de maio de 2008


Marchas regionais de protesto, este sábado às 15h


Évora, Praça do Giraldo
Lisboa, Alto do Parque Eduardo VII
Coimbra, Praça da República
Porto, Praça D.João I

É este o caminho?


O secretário de Estado da Educação, Valter Lemos, reafirmou hoje, em Penafiel, que no próximo ano lectivo cerca de 50 por cento dos alunos do ensino secundário em Portugal frequentarão cursos profissionais.

"Estamos a trabalhar para que os alunos possam sair das escolas para o mundo do trabalho levando consigo uma qualificação", salientou.

Falou da atenção redobrada da tutela na dinamização dos cursos profissionais nas escolas secundárias e dos cursos de educação/formação que têm contribuído para que, pela primeira vez em 15 anos, se tenha verificado este ano um aumento do número de alunos nas escolas portuguesas.

Vê aqui a notícia toda


Comentário:

Na verdade, é o camninho mais fácil: a qualidade de muitos dos cursos de formação profissional e de educação/formação é duvidosa. Mas mais do que isso representa uma desistência da Escola Pública em combater as desigualdades de partida e a inevitabilidade do destino do filho de ricos e do destino do filho de pobres. É a manutenção e promoção do statuos quo e de uma ordem social tão bem explicada no texto “Humanidade Supranumerária”

Revisitar a Escola da Ponte


Entrevista a José Pacheco, um dos principais mentores da Escola da Ponte, na Vila das Aves:

Sobre o isolamento da Escola da Ponte:
“Acompanho o trabalho de muitos professores envolvidos em projectos de mudança, inevitavelmente diferentes do projecto da Ponte, mas que partilham da mesma intenção: transformar as escolas em espaços de fazer dos jovens seres mais sábios e pessoas mais felizes. (...)Não acredito em modelos, muito menos acredito na clonagem de projectos. Acredito nos professores que vão construindo alternativas a uma escola obsoleta, geradora de insucesso e infelicidade."

Sobre as críticas:
“Juntam à crítica do "eduquês" (aberração que eu também critico) um ódio primário a tudo o que possa constituir inovação. Não conseguem entender que o seu discurso favorece a manutenção de práticas caducas, responsáveis pelo caos em que o sistema está imerso. Talvez creiam que, para ser professor, basta ter formação técnica, científica. Não basta! Se os "críticos" investissem algum tempo no estudo das (desdenhadas) ciências da educação, talvez tomassem consciência dos disparates que publicam.”

Vê no site da Educare a entrevista toda

A paranóia dos exames


Um grupo de deputados do Parlamento Britânico divulgou um relatório que conclui que o ensino demasiado direccionado para os exames e os testes escritos deixa os alunos mal preparados para o mundo do trabalho. O relatório conclui, ainda, que uma ênfase inapropriada nos testes e nos exames impede os alunos de terem acesso a uma educação equilibrada. Ensinar para os testes e para os exames faz com que o currículo se torne demasiado estreito, impedindo os alunos de adquirirem outras competências necessárias ao mundo do trabalho. Leia o resto no Independent.

Comentário
Há muito tempo que se sabe isto. Ensinar para os exames e para os testes impede os alunos de desenvolverem competências importantes: criatividade, espírito crítico, capacidade de pesquisa, espírito de colaboração e gosto pelo trabalho em equipa. A ênfase que alguns países têm colocado nos exames nacionais tem vindo a condicionar e a limitar a escolha dos métodos de ensino. Os professores são pressionados a privilegiarem as actividades de memorização e o ensino rotineiro, em vez de acentuarem a realização de tarefas criativas e colaborativas.

Publicado em ProfAvaliação, por Ramiro Marques

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Estudantes e professores franceses mobilizam-se pela Escola Pública


O projecto do governo francês para reduzir o número de funcionários públicos confrontou-se hoje com a terceira greve do sector público desde que Sarkozy chegou ao poder. Pelo menos 300 mil professores fizeram greve nesta quinta-feira.

O governo francês pretende acabar com inúmeros postos de trabalho na função pública, 11200 dos quais no ensino e, dentro destes, 8000 professores. Os sindicatos afirmam que se vai criar uma disfunção no serviço público, com menos disciplinas nos colégios e mais alunos por turma.

Os estudantes têm demonstrado a sua solidariedade com os professores, engrossando as diversas manifestações. Em Paris, esta tarde, mais de 50 mil pessoas fizeram-se ouvir na defesa da Escola Pública.

Onde está o investimento no Ensino Especial?


As mães destes "filhos diferentes" sublinharam a falta de apoios do Estado e o sentimento de exclusão que ainda sentem quando, por exemplo, tentam inscrever as crianças na escola. "Falta apoio ao nível da intervenção precoce", reforçou Joaquina Teixeira, mãe de Gonçalo, 5 anos, contando que teve de pôr o filho numa escola particular onde, recentemente, lhe foram retirados apoios. Joaquina explica que, na sequência da alteração da lei do ensino especial, foram retirados apoios às tarefeiras que cuidavam destas crianças. E dá mais um exemplo: "Nunca consegui uma terapia da fala para o meu filho no Estado, ou porque não havia vagas ou não havia verbas."

In DN Online desta quinta-feira

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Humanidade Supra-numerária


Recebemos por e-mail este texto (com a indicação que foi retirado do Diário Económico).

Ilustra bem o que é o trabalho para as estatísticas que a Ministra pretende desenvolver e a quem é que ele serve.

Mais uma vez, lembramos: é preciso sim senhor acabar com os chumbos, mas não de forma artificial. É preciso que todos os alunos profgridam, sem chumbos, mas que o façam sabendo, criando, autonomizando-se. E para isso é preciso investir a sério na Escola Pública, em vez de lamentar os cifrões perdidos com as retenções. Segue o texto:



"Em Dezembro, o estudo da OCDE afirmava: os alunos portugueses de 15 anos estão abaixo da média entre 57 países a Ciências, Matemática e Leitura. Este facto gerou mais um conceito "eduquês" de um secretário de Estado que disse à TV qualquer coisa do tipo "Os alunos são ignorantes porque são reprovados" já que os resultados se devem em larga medida às elevadas taxas de retenção. Tão irresponsável doutrina dá crédito a uma curiosa tese da qual se pincelam os traços principais abaixo.

Humanidade supra-numerária
A correspondência entre "progresso da ignorância" e declínio da inteligência crítica é evidente, como o é a necessidade de competência linguística elementar
para o exercício do juízo crítico. Isto assente, porque se aprofunda e tolera a iliteracia que o quotidiano e estudos demonstram?

Michéa atribui-a à implantação da Escola do Poder Transnacional assente em reformas perversamente justificadas pela "democratização do ensino" e "adaptação ao mundo moderno".

Ilustra a teoria com reunião de "quinhentos homens políticos, líderes económicos e científicos de primeiro plano", em S. Francisco, que concluiu que "no século XXI, dois décimos da população activa serão suficientes para manter a actividade da economia mundial", pondo a questão: como manter a governabilidade dos oitenta por cento da humanidade supra-numerária?

A solução mais razoável lá defendida é do conhecido Z. Brzezinsky: "criando 'cocktail' de diversão embrutecedora e alimentação suficiente que permita manter o humor dessa população". Este cínico objectivo implicaria reconfigurar o sistema educativo do modo que se passa a sintetizar e se vem assistindo.

Excelência para poucos
Primeiro, há que manter um selectivo sector de excelência que forme as elites científicas e de gestão, enformado pelo modelo da escola clássica, criador de espírito crítico.

No escalão seguinte, ensinam-se competências técnicas com semi-vida estimada de dez anos e ligadas a tecnologias efémeras. Competências descartáveis quando as tecnologias são superadas e cuja aprendizagem não exige autonomia, nem criatividade e, no limite, pode ser feita em casa, frente ao computador. Ajustada ao ensino multimédia à distância proporciona negócio às grandes firmas e torna dispensáveis milhares de professores, sonho economicista e político dos meios do poder.

Ignorância para muitos
Resta o escalão dos supra-numerários (com emprego precário e flexível) que, "jamais constituirão um mercado rentável" e a quem "a transmissão de saberes críticos e mesmo de comportamento cívicos e o encorajamento à rectidão e à honestidade" é indesejável.

A esses se destina a escola dos grandes números, a escola que deve ensinar a ignorância coerente com Brzezinsky. É a escola que produz ignorantes diplomados, incapazes de compreender um texto, ou serem proficientes em matemática. O ensino da ignorância é objectivo ao qual os professores tradicionais, apesar de excepções, se ajustam mal o que implica a sua reeducação por neo-especialistas em ciências da educação.

Estes peritos têm por missão impor condições de "dissolução da lógica" no Ensino, real revolução cultural porque, até recentemente, "toda a gente pensava com um mínimo de lógica, com a notável excepção dos cretinos e dos militantes" . Os professores tornar-se-ão animadores de actividades transversais e assistentes psicológicos. A escola será um espaço acrítico, um local de animação (Thanksgiving, Halloween...) confiada a associações de pais, aberto a todas as mercadorias tecnológicas ou culturais.

Fascinante e preocupante!
Difícil acreditar que haja esta estratégia capitalista específica, mas as mesmas consequências resultam de políticas incompetentes e do deslumbramento estrangeirado que assolam o país. É imperativo de cidadania reverter decisões e políticas que alicerçam
um Ensino da Ignorância que converta 80% dos portugueses em supra numerários embrutecidos de uma UE, ela própria, ameaçada pelo mesmo mal."
____
Manuel Gonçalves da Silva, Professor Catedrático da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UNL e membro do painel Ciência e Sociedade

Titulares e não titulares


Tenho cinquenta e tal anos de idade, trinta e muitos dos quais como docente no ensino secundário e no ensino superior.
Fiz a Licenciatura com 16 valores, o Estágio Pedagógico com 18 e um mestrado em Ciências da Educação com Muito Bom.

Dediquei a minha vida à Escola Pública. Fui Presidente do Conselho Executivo (dois mandatos), orientador de estágio pedagógico (3 anos), delegado de grupo / coordenador de departamento (dois mandatos), Presidente do Conselho Pedagógico (um mandato) e director de turma durante vários anos.

Nos últimos tempos leccionei no ensino superior, com ligação permanente à formação de professores.Desempenhei vários cargos pedagógicos, participei em múltiplos projectos e desenvolvi dois trabalhos de elevado valor científico.
Entretanto, regressei ao ensino secundário e à minha escola de origem.

Alguns dos antigos colegas, embora mais novos do que eu e com menos tempo de serviço (compraram o tempo, explicaram-me depois) já se tinham reformado. Eu também já tinha idade, mas faltavam-me alguns meses para o tempo necessário quando mudaram as regras do jogo. E como se não bastasse a alteração dessas regras, é aprovado, entretanto, um novo estatuto para a carreira docente. E logo de seguida é aberto o concurso para professores titulares. Um concurso para uma nova categoria onde eu não tinha lugar!
Não reunia condições. Mesmo com um Mestrado em Ciências da Educação e sem ter dado uma única falta nos últimos sete anos, o meu curriculum valia, apenas, 93 pontos! Faltavam 2 pontos para o mínimo exigido a quem estivesse no 10º escalão.

Com as novas regras, o meu departamento passou a ser coordenado, a partir do presente ano lectivo, por um professor titular. Um professor que está posicionado no 8º escalão. Tem menos 15 anos de serviço do que eu. Foi meu aluno no ensino secundário e, mais tarde, meu estagiário. Fez um bacharelato com média de 10 valores e no estágio pedagógico obteve a classificação de 11 valores. Recentemente concluiu a licenciatura numa estabelecimento de ensino privado, desconhecendo a classificação obtida. É um professor que nunca exerceu qualquer cargo pedagógico, à excepção de director de turma. Nos últimos sete anos deu 84 faltas, algumas das quais para fazer 15 dias de férias na República Dominicana (o atestado médico que utilizou está arquivado na secretaria da escola, enquanto os bilhetes do avião e a factura do hotel constam de um outro processo localizável). O seu curriculum vale 84 pontos, menos 9 pontos do que o meu. Contudo, este docente foi nomeado professor titular.

De acordo com o Senhor Primeiro Ministro e demais membros do seu Governo, com o apoio do Senhor Presidente da República e, agora, com o apoio dos dirigentes sindicais, este professor está em melhores condições do que eu para integrar " (...) um corpo de docentes altamente qualificado, com mais experiência, mais formação e mais autoridade, que assegure em permanência as funções de organização das escolas para a promoção do sucesso educativo, a prevenção do abandono escolar e a melhoria da qualidade das aprendizagens."
A conclusão, embora absurda, é clara: se eu estivesse apenas no 9º escalão, e com os mesmos pontos, seria considerado um docente altamente qualificado, com mais experiência, mais formação e mais autoridade. Como estou no 10º escalão, e não atingindo os 95 pontos, eu já não sou nada.

Isto é o resultado de uma selecção feita com base na "(...) aplicação de uma grelha de critérios objectivos, observáveis e quantificáveis, com ponderações que permitam distinguir as experiências profissionais mais relevantes (...)[onde se procurou] reduzir ao mínimo as margens de subjectividade e de discricionariedade na apreciação do currículo dos candidatos, reafirmando-se o objectivo de valorizar e dar prioridade na classificação aos professores que têm dado provas de maior disponibilidade para assumir funções de responsabilidade." É assim que "reza" o DL 200/2007, de 22 de Maio. Admirável!

Agora consta-se por aí (e por aqui) que aquele professor (coordenador do meu departamento) me irá avaliar...
Não, isso não será verdade. Esse professor irá, provavelmente, fazer de conta que avalia, porque só pode avaliar quem sabe, quem for mais competente do que aquele que se pretende avaliar.

O título de "titular" não é, só por si, suficiente. Mesmo que isto seja só para fazer de conta...
Conhecidos que são os meus interesses, passo ao principal objectivo desta carta, que é, simplesmente, pedir perdão!

Pedir perdão, em primeiro lugar, aos meus alunos. Pedir perdão a todos os Pais dos meus alunos. Pedir perdão porque estou de professor, mas sem me sentir professor. Tal como milhares de colegas, humilhados e desencorajados, sinto-me transformado num funcionário inútil, à espera da aposentação.

Ninguém consegue ser bom professor sem um mínimo de dignidade. Ninguém consegue ser bom professor sem um mínimo de paixão.
As minhas aulas eram, outrora, coloridas, vivas e muito participadas. Com acetatos, diaporamas, vídeos, powerpoint, etc. Hoje é, apenas, o giz e o quadro. Só a preto e branco, com alguns cinzentos à mistura.

Sinto-me desmotivado, incapaz de me empenhar e de estimular. Receio vir a odiar a sala de aulas e a própria escola. Receio começar a faltar para imitar o professor titular e coordenador do meu departamento (só não irei passar férias para a República Dominicana porque tenho outras prioridades...). Receio que os professores deste País comecem a fingir que ensinam e a fingir que avaliam. Sim, porque neste país já tudo me parece a fingir.

Cumprimentos.
(Um professor anónimo e humilhado, tal como milhares de outros professores)

Por Antero Valério, publicado no Anterozóide

terça-feira, 13 de maio de 2008

Pequena sugestão para os fazedores de grelhas

Depois de ter lido aqui em baixo a mãe de todas as grelhas, achei por conveniente apresentar algumas sugestões. Em primeiro lugar, creio que o ponto 10 devia ser decisivo. Sobretudo na avaliação de quem faz grelhas. Tomado a sério o ponto “evita banalidades e perdas de tempo” pouparia ao escritor uns bons noventa pontos de avaliação de condutas. É inspirado e embalado por este por este, modestamente, ouso sugerir aos ilustres construtores de grelhas que se limitem aos pontos seguintes:

Objectivos sobre condutas dos docentes:
1- Diz sim a tudo o que venha dos seus superiores hierárquicos;
2- Empenha-se mais e mais e mais e mais… (Calma com a interpretação: empenhar aqui deve ser lido no sentido de se sentir culpado sempre que se faça qualquer coisa porque nessa coisa deveria estar – sempre – mais empenhado do que o que se está ou no sentido do avaliador poder – sempre – defender que se poderia estar mais empenhado. Não relacionar a expressão “empenha-se” com as descidas dos salários reais ou com a inflação).
3- Trabalha (muito) para além do que é o seu horário de trabalho;
4- É perfeito de acordo com a Ordem Moral Burocrática que definiu todos os traços do empregado modelo.

Como esta grelha não está fechada, podem sugerir novos pontos.

Escrevendo um pouco mais a sério: a avaliação do trabalho imaterial ao implicar dimensões como o “empenho” leva a colocar no terreno dispositivos de controlo por parte de patrão/superior hierárquico destinados a extrair mais-valia eterna e culpabilizadora porque se pode exigir sempre mais empenho (creio que a análise do professor José Gil numa conferência recente ia neste sentido). É o que se passa com os professores, com a divisão da carreira, com a gestão anti-democrática.
Está em curso uma transformação do carácter intelectual da profissão docente que afoga a investigação e a criatividade num mar de regras absurdas. Já todos percebemos que esta burocratização da profissão docente no caminho que nos querem impor. É fatal como o destino. O que não é fatal é que os/as professores/as a aceitem.

Carlos Carujo, Elvas

segunda-feira, 12 de maio de 2008

As 96 condutas propostas pelo guru da avaliação dos docentes


Aqui reproduzimos a grelha usada pelo formador de professores, Dr. Fatal Nogueira, no âmbito dos cursos do Instituto Nacional de Administração, pagos a 200 euros por cabeça.

Consta que este Doutor ficou melindrado pelo facto da divulgação desta grelha constituir uma violação dos direitos autorais. Para nós, a sua divulgação é apenas a demonstração do estilo burocrático que infecta as escolas. E devia fazer corar de vergonha o seu autor.

O que segue é de arrepiar: um conjunto de generalidades, repetições, banalidades e subjectividades. Um palavreado entediante.

O sublinhado é nosso


CONDUTAS
1. É pontual.
2. Disponibiliza-se para actividades que ultrapassam obrigações horárias/profissionais.
3. Cumpre prazos .
4. Quando trabalha em equipa é um elemento participativo e não conflituoso.
5. Zela e preserva material/equipamento escolar.
6. Proporciona ambiente calmo, propício à aprendizagem.
7. Numa reunião tem uma atitude de colaboração e de entreajuda.
8. Manifesta opinião própria e construtiva relativamente a assuntos debatidos.
9. Não gera mau ambiente no local de trabalho.
10. Evita banalidades e perda de tempo.
11. É receptivo à mudança.
12. Dá sugestões / tem opiniões críticas para melhoria de serviços.
13. Faz formação de acordo com o projecto educativo da escola (1/3).
14. Faz formação na sua área específica (2/3).
15. Disponibiliza-se para apoiar os alunos após as horas lectivas, sempre que considere necessário.
16. Regista e avalia o cumprimento das actividades planificadas.
17. Estabelece planos de acção para corrigir desvios.
18. Apoia o desenvolvimento de métodos de aprendizagem / estudo.
19. Estabelece e faz respeitar regras de convivência, colaboração e respeito.
20. Aplica os critérios de avaliação aprovados pelos órgãos competentes.
21. Cumpre o horário - substituir parâmetros de assiduidade
22. Mantém a calma perante uma situação de tensão com alunos, professores ou pais.
23. Mantém limpo e arrumado o local de trabalho.
24. Oferece-se para ajudar em outras áreas que não a sua quando é necessário.
25. Predispõe-se para ajudar as pessoas aquando da necessidade de urgência no serviço
26. Conhece o PE da escola, a missão e a visão da escola.
27. Utiliza correctamente os equipamentos.
28. Verifica o estado dos equipamentos antes e depois da sua utilização.
29. Zela pelo cumprimento do regulamento interno da escola.
30. É educado e cordial com todos os elementos da comunidade escolar
31. Perante uma situação determinada, apresenta diferentes alternativas como solução.
32. Comunica por escrito ao conselho executivo sugestões a implementar (por ex:com base na análise de melhores práticas de outras escolas ou organizações) que ajudam a garantir um serviço de mais qualidade.
33. Mantém a confidencialidade e discrição perante determinadas situações.
34. Recolhe diferentes opiniões ou sugestões procurando criar sinergias com os seus colegas com a mesma função.
35. Colabora / age no sentido de proporcionar um bom clima de escola.
36. Resolve situações de conflito sem ter que solicitar ajuda extra.
37. Assiste a aulas de colegas sempre que considera útil.
38. Permite que outros colegas assistam a aulas suas.
39. Actua de forma rápida e eficaz, de acordo com critérios predefinidos, dentro das acções previstas nos processos de trabalho em que está envolvido
40. Age com assertividade e discernimento, encontrando as soluções mais pertinentes para cada situação, apresentando-as ao respectivo responsável hierárquico.
41. Analisa problemas e toma decisões relativas a rotinas de trabalho, não necessitando de apoio superior.
42. Avalia sistematicamente os resultados que se propõe atingir e reformula as actividades para atingir os resultados de forma mais eficaz.
43. Cumpre prazos.
44. Transmite a sua opinião de forma racional e controlada.
45. É receptivo à mudança e envolve os seus pares para melhorar a sua área, a dos outros e a escola no seu todo, não se opondo às questões.
46. Quando é chamado a desenvolver outras actividades, encara sempre a situação de uma forma positiva, predispondo-se para actuar.
47. Revela empenho no desenvolvimento das tarefas, realizando-as antecipadamente.
48. Toma decisões e assume a responsabilidade não jogando a culpa dos problemas para cima de outros.
49. Sugere soluções inovadoras, antecipando a ocorrência de problemas.
50. Gere com eficiência todos os meios existentes na escola.
51. Procura todas as oportunidades de formação de forma a alargar conhecimentos específicos relativos à área da sua intervenção.
52. Propõe actividades com vista à modernização e desenvolvimento da comunidade onde se integra (extravasando os limites da escola).
53. Supera as expectativas do grupo com contribuições activas de desenvolvimento, motivando estes a seguir o exemplo, oferecendo ajuda e dando opiniões construtivas (não havendo rejeições das suas contribuições).
54. Assiste a eventos desenvolvidos por qualquer tipo de entidade.
55. Está ao corrente de situações e dificuldades de outras escolas desenvolvendo soluções na escola como prevenção.
56. Perante uma dificuldade na escola conversa com outros colegas que possam partilhar situações similares e sugere determinadas acções.
57. Traz à escola pessoas de assuntos de interesse partilhando experiências.
58. Desenvolve planos de acção para a implementação de melhores práticas pesquisadas e adequadas à escola.
59. Fomenta o networking interno e externo através de comunicações e actividades.
60. Analisa continuamente as tendências dos outros e procura implementar as melhores práticas para encontrar as melhores soluções.
61. Aplica a formação recebida nas tarefas que lhe são atribuídas.
62. Aproveita ideias de outras áreas ou de organizações semelhantes e adapta-as à sua.
63. Avalia sistematicamente os resultados que se propõe atingir e reformula as tarefas, no sentido da melhoria, ou seja, faz alterações ao previsto, para atingir os resultados de forma mais eficaz.
64. Consegue sinergias com outras áreas da organização no sentido de facilitar ou agilizar o serviço.
65. Identifica situações que fogem do padrão do controle previsto e apresenta soluções ao Coordenador no sentido de evitar possíveis problemas.
66. Organiza e coordena actividades consideradas por outras áreas como melhores práticas e incorpora-as com vista à superação dos resultados previamente estabelecidos, apresentando propostas ao Coordenador para superação de objectivos através de um plano de a
67. Orienta e planeia acções com uma visão partilhada que potencia a missão e os valores da organização.
68. Partilha técnicas, ferramentas e conhecimentos dentro da organização.
69. Partilha técnicas, ferramentas e conhecimentos fora da organização, por exemplo fazendo apresentações em congressos, palestras, etc
70. Partilha técnicas, ideias e recursos melhorando o trabalho em equipa através de aconselhamentos aos seus colaboradores.
71. Predispõe-se para ajudar as pessoas aquando da necessidade de urgência no serviço.
72. Procura todas as oportunidades de formação de forma a alargar conhecimentos específicos relativos à área da sua intervenção.
73. Sempre que verifica alguma anomalia mesmo que não seja da sua área sugere soluções simples mas concretas.
74. Contribui para a mudança planeando melhores práticas e tomando iniciativas, com base em projectos de autonomia e liderança, medindo o grau de satisfação de pelo menos 75% dos seus colaboradores através de pesquisas de satisfação rápidas
75. Apresenta por escrito propostas de soluções novas de problemas fora da sua área de trabalho e de actuação
76. Cria acções novas e motivadoras para a manutenção da disciplina na sala.
77. Cria e implementa novas formas e metodologias que favorecem a participação dos alunos na realização da aula.
78. Cria ferramentas de controle da sua actividade ou de outros dentro da organização que sejam simples mas resolvam os problemas de acompanhamento.
79. Cria instrumentos que proporcionam auto avaliação dos alunos com rigor e objectividade.
80. Cria novos métodos de estudo para os alunos, demonstrando a sua eficácia.
81. Cria novos sistemas ou metodologias nas turmas que estimulam o processo de ensino-aprendizagem.
82. Cria processos e critérios de avaliação e partilha com os avaliados, obtendo consenso e validação.
83. Desenvolve recursos inovadores para a realização de actividades lectivas.
84. É capaz de desenhar condutas observáveis dos colegas avaliados de forma simples e objectiva.
85. Envolve-se em projectos comunitários inovadores por iniciativa própria.
86. Estabelece mecanismos novos de seguimento ou acompanhamentos da implementação dos planos de melhoria negociados com os avaliados.
87. Executa um projecto de liderança inovador e consegue implementar ideias revolucionárias e estratégicas, envolve as pessoas nesses projectos não deixando de fora ninguém.
88. Inova com ideias jamais testadas em algum lado e prova que a organização poderá beneficiar disso.
89. O professor cria e implementa processos claros e reconhecidos pelos alunos para facilitar a sua disponibilidade e apoio aos mesmos.
90. Preocupa-se no desenho e implementação de novas ideias criadas por ele que ajudem a escola na redução do abandono escolar.
91. Propõe novas actividades com vista à modernização e desenvolvimento da comunidade onde se integra.
92. Quando apresenta os problemas apresenta também hipóteses de várias soluções criadas por ele, devidamente estudadas e analisadas e dá a sua opinião de como o problema pode ser resolvido da melhor forma.
93. Sugere novas estratégias para a resolução de problemas.
94. Sugere novos critérios que permitam fazer uma análise da planificação e estratégias de ensino para a adaptação ao desenvolvimento das actividades lectivas.
95. Sugere soluções inovadoras, antecipando a ocorrência de problemas.
96. Utiliza os resultados da avaliação dos alunos como base para criar novas formas de actividade lectiva que permitam desenvolver com eficácia e competência as atitudes dos alunos.

Debate pela Escola Pública, no Porto


Decorreu, na passada 5ª feira, às 21.30h, na Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo, no Porto, a primeira sessão pública do nosso Movimento, organizada pelo colectivo local de professoras e professores.

A sessão constituiu um momento de reflexão e debate com todas e todos aqueles que, preocupados com o rumo que a educação está a tomar, se juntaram pela defesa da Escola Pública, pela Igualdade e a Democracia.

Os oradores convidados – José Alberto Correia (da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, da Universidade do Porto, José Paulo Serralheiro (Director do Jornal “A Página” da Educação) e Manuel Sarmento (do Instituto de Estudos sobre a Criança, da Universidade do Minho) – enriqueceram o debate com a sua experiência no campo educativo e as suas reflexões neste domínio.

José Alberto Correia alertou para que a crise da modernidade educativa é também uma crise dos modos de se pensar a educação e dos modos como se relacionam os diferentes "discursos" que constroem e reconfiguram os fenómenos educativos, propondo uma digressão histórico-epistemológica sobre a construção da moderna cientificidade educativa, situando-a num espaço de controvérsia e procurando "discernir" nas suas fragilidades um conjunto de vantagens acrescidas susceptíveis de reconfigurarem uma recientifização do campo educativo, construída em torno de uma racionalidade comunicacional crítica e emancipatória.

José Paulo Serralheiro estabeleceu, de forma jocosa e crítica, a analogia entre a estrutura militar e a organização do sistema de ensino e da escola, concluindo da necessidade de repensar a sua estrutura, cuja crise se manifesta desde há muito.

Manuel Sarmento defendeu a Escola Pública por oposição à escola privada, criticando as políticas neoliberais e neoconservadoras do ministério da tutela e realçando a necessidade de trazer ao conhecimento geral as escolas e as experiências de carácter democrático e emancipador existentes no país.

O debate, que contou com meia centena de participantes, decorreu de forma entusiasta e animado pela convicção da necessidade premente de reflexão e acção no terreno, de uma cidadania activa, empenhada em defender a democracia e a igualdade no plano de uma escola pública reforçada.

João Antunes

domingo, 11 de maio de 2008

Feira de Fichas

Com o processo de avaliação no ponto em que o “entendimento” entre a ministra e os sindicatos o deixou, com várias portas entreabertas para que prossiga ou se enterre, o certo é que nalgumas escolas os instrumentos para a avaliação dos professores foram elaborados e, nalguns casos, aprovados.
Variam de escola para escola, dos mais aos menos (mais) disparatados, profundamente diferentes, contraditórias, exageradas, inaplicáveis, insensatas, burocratizantes…
Analisar, comparar, desconstrui-las deve merecer toda a nossa atenção.
Enviem-nos exemplares dessas fichas já aprovadas ou em vias de aprovação. movimentoescolapublica@gmail.com é o nosso endereço.

A FNE e os Movimentos

Em entrevista ao Público de hoje, Dias da Silva da FNE discorre acerca dos Movimentos de Professores. Falando ou do que não sabe ou do que não quer saber, faz afirmações extraordinárias. Respiguemos uma:
" há diferenças radicais entre o funcionamento dos movimentos informais de cidadãos e os sindicatos. (…) em democracia, a legitimidade da representação dos trabalhadores pertence aos sindicatos e a mais ninguém."
Ou esta:
"Não devemos criar confusões com entidades amorfas, que não têm dirigentes eleitos. Prestam contas perante quem? E de quê? Nos sindicatos as opções não resultam de conversas de café ou de encontros na sala de professores, são o resultado do funcionamento de órgãos constituídos democraticamente."
Dias da Silva excedeu-se, só pode. Foi deslizando, deslizando e lá foi dizendo o que provavelmente outros pensam, mas têm mais contenção verbal. Educados a isso, evidentemente.
A existência dos movimentos pode provocar bordoeja aos sectores mais burocratizados e empedernidos das estruturas sindicais. É também verdade que nalguns movimentos sopre uma pulsão de alguma arrogância alternativa aos sindicatos, mas, duma parte e outra, não tomemos a parte pelo todo.
E acima de tudo, não subestimemos o papel fundamental que os movimentos, na sua pluralidade, na sua diversidade, mesmo na sua efemeridade, desempenharam a caminho do 8-de-Março-da-nossa-indignação. Introduziram elementos novos, formas de comunicação novas, obrigaram a uma atenção mais detalhada por parte dos diferentes poderes instalados, deram sinais de uma cidadania activa, incómoda evidentemente.
E fazem falta apara que o debate saia da sala de professores e das reuniões sindicais e adquira maior dimensão pública.
Os seus objectivos concretos, a sua identidade, a sua legitimidade, a sua organicidade é a que aqueles que os protagonizam quiseram que tenha. Pela nossa parte, como afirmamos no nosso manifesto:
“(…) queremos fazer parte da resposta emancipatória, empenhamo-nos na construção de um Movimento que promova a escola pública pela igualdade e pela democracia. Ao subscrever este Manifesto queremos dar corpo a uma corrente que mobilize a cooperação contra a competição, a inclusão contra a exclusão e o preconceito, que dê visibilidade a práticas e projectos apostados numa escola como espaço democrático, de cidadania, de conhecimento e de felicidade, porque uma outra escola pública é possível”
É por aí que vamos.
JM