Quase toda a gente sabe que o modelo de organização escolar tem prestado relevantes serviços à sociedade e às pessoas. Mas, nas últimas décadas, com a escolarização de massas, tem tido dificuldade em cumprir as promessas consagradas nas leis, com destaque para a promessa da igualdade de oportunidades de acesso, de sucesso e de usufruto dos bens educacionais.
Enquanto não temos um modelo alternativo de escolarização temos de procurar renovar o que existe. Aqui enuncio 10 princípios que podem contribuir para que tal aconteça.
1) Princípio da escuta. A escuta é um dos pilares da educação. Sem escuta não há compreensão do outro, não há proximidade, não há adequação, não há a convocação do ser para se inscrever no projeto de aprender. Precisamos de praticar, insistentemente, como defendia Rubem Alves, a escutatória, essa arte de nos centrarmos empaticamente na fala e nos silêncios do outro.
2) Princípio da confiança. A confiança é uma condição sine qua non da educação. Sem confiança nas potencialidades e na perfetibilidade do ser humano não há projeto educativo que possa ter sucesso. Sem confiança na capacidade e no poder transformador dos professores, sem confiança na possibilidade do compromisso de todos, a educação será uma palavra sem sentido.
3) Princípio da proximidade. A proximidade é a base da pedagogia. Sem proximidade o outro é um número que apenas conta para as estatísticas. Educar é estar próximo para perceber os bloqueios, os impasses, os talentos que podem emergir.
4) Princípio da diversidade. Porque a escola não pode mais ser alimentada com a ideia de que podemos ensinar todos como se todos fossem um só. «Tudo é diferente de nós e por isso é que tudo existe», como sustentava Fernando Pessoa. A diversidade é, pois, um princípio vital que tem de ser transposto para a ação pedagógica. Nos métodos, nas atividades, nos tempos, na avaliação. Porque a indiferença às diferenças só gera o insucesso.
5) Princípio da comunidade. Sem o sentido de pertença é difícil haver ambientes favoráveis de aprendizagem. Precisamos de cultivar valores, códigos, sentidos partilhados e comuns.
6) Princípio da flexibilidade. A flexibilidade tem muito a ver com a diversidade, mas é sinónimo. Ser flexível na gestão do agrupamento de alunos e na gestão do tempo (por exemplo) para que a ação educativa se possa adequar às singularidades do outro.
7) Princípio da humanidade. O sentido de humanidade naquilo que fazemos na escola é o que permite fazer crescer as crianças na autonomia, na liberdade, na responsabilidade, no respeito, na compaixão. Este princípio rejeita o excesso de escola (a escola a tempo inteiro que muitas vezes é uma prisão sem sentido), a escola como estação de serviço.
8) Princípio do exemplo. Porque a escola não pode ser só discurso. Tem de ser ação, exemplo, referências concretas. É sabido que ensinamos o que somos. E ensinamos por aquilo que fazemos. Mais do que pensamos.
9) Princípio da exigência. Porque a vida é cruel e vai exigir muito de nós precisamos de promover o rigor, o método, a resiliência, a determinação, o valor do conhecimento. Porque a vida não é um passatempo.
10) Princípio da aprendizagem. Todos estamos na escola para aprender, coisas certamente diferentes, mas complementares. E o trabalho dos alunos é aprender. Quando não aprende não está a cumprir o seu ofício. Não está a crescer, a desenvolver-se. Aprender sempre é o nosso destino e a nossa condição existencial.
Outros princípios haverá. Mas estes, quando levados à prática, são certamente alavancas poderosas da transformação da escola.
José Matias Alves
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