segunda-feira, 23 de junho de 2008

Avaliação de professores: Esta não! Mas qual?


No dia 21 de Junho o Movimento Escola Pública Igualdade e Democracia promoveu, na Associação 25 de Abril pelas quinze horas e trinta minutos, uma sessão pública com Olga Pombo, professora da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Paulo Guinote, professor do 2º ciclo do ensino básico e autor do blog “A Educação do Meu Umbigo”, João Paulo Videira, professor e dirigente da Fenprof, e Manuel António Silva, investigador do Instituto de Educação e Psicologia da Universidade do Minho, moderado por Cecília Honório, do Movimento Escola Pública Igualdade e Democracia. Discutir o modelo de avaliação docente apresentado pelo Ministério da Educação e formular propostas alternativas a esse modelo foi o desafio apresentado aos convidados e à assistência.

“As palavras não têm dono”. Foi com esta citação de Saramago que o investigador Manuel António Silva iniciou o debate. O uso de palavras, palavras sedutoras como lhes chamou, como avaliação, mérito e competência não é um acto desprovido de intenção, as palavras são escolhidas com um objectivo determinado, para servirem uma mensagem específica, podendo apresentar diferentes sentidos consoante o emissor, no contexto actual estas são usadas com a intenção de legitimar políticas que se encontram ocultas.

A palavra avaliação, avaliação em geral e dos docentes em particular, é usada como se de um campo de estudo desligado dos outros se tratasse. Quando se fala da avaliação procura-se que esta seja entendida como uma disciplina de estudo científico, mas esta não pode ser considerada uma ciência pois não é definido pela ciência mas sim pela política. Neste contexto são duas as tipologias apresentadas para o conceito de avaliação, podendo esta ser autocrática ou democrática. A avaliação democrática pressupõem que os actores envolvidos tenham poder e possam tomar decisões sobre as situações envolvidas, portanto para que a avaliação de professores fosse um processo democrático era necessário que estes pudessem tomar decisões sobre a sua avaliação, pois tendo em conta que os professores sempre tiveram uma lógica de funcionários é “batota” dizer que o podem fazer.

Outra palavra sedutora é a palavra mérito. Por que motivo se quer avaliar de uma forma diferente? A resposta dada pelos políticos é para que se possa distinguir o mérito de cada um. A palavra mérito encontra-se actualmente associada ao conceito de meritocracia que é entendido como democracia construída com base no mérito, o que adultera o seu sentido original. O conceito de mérito, como foi apresentado pelo sociólogo Ivor Morrish em 1975 no seu livro Anomia, implica uma nova forma de transmissão de bens, nas novas sociedades a antiga elite, cuja transmissão de bens se encontrava assente na hereditariedade, irá ser substituída por uma nove elite cuja prescrição é o mérito, o mérito é entendido pelo autor como um novo pilar da construção das sociedades em que os indivíduos mais capazes, mais competentes, serão justamente colocados e recompensados pelos seus esforços, o que tem permitido que alguns acumulem fortunas intermináveis opondo-se à democracia.

Segundo a Professora Olga Pombo, vivemos numa época de excesso de avaliação. A obsessão pela avaliação não afecta apenas a Escola mas atravessa toda a sociedade, somos tomados pela necessidade de objectivos quantificados, traduzidos em grelhas que são incessantemente construídas e preenchidas. A gestão, capacidade de prever antecipadamente e alcançar as metas estabelecidas, tornou-se numa das disciplinas centrais no funcionamento da sociedade.

Nas Escolas a avaliação é tida como indispensável ao seu funcionamento, não se encontrando reduzida à questão da avaliação dos professores. Esta obsessão pela avaliação remete-nos para a pergunta: “O que é que a Escola tem a ver com a avaliação?” A avaliação permite averiguar se os alunos adquiriram a etapa anterior, um dos pressupostos da avaliação contínua, parte da ideia de que a educação resulta da colocação de tijolo sobre tijolo, pressupondo que não é possível ensinar sem avaliar. A avaliação serve a distribuição dos indivíduos nas suas posições sociais, passa-se a pensar que as pessoas devem ser distribuídas pelos conhecimentos adquiridos.

É possível pensar a Escola sem que esta tenha de estabelecer uma hierarquia das pessoas. A Escola, instituição inventada a 2500 M.a., foi criada não para educar, esse é um papel atribuído às sociedades, mas para permitir a construção do conhecimento em simultâneo com a ciência de modo que cada geração, num período de tempo curto, possa saber o que as gerações anteriores fizeram. A Escola era entendida como o lugar onde os jovens se colocam aos ombros de gigantes, nela a avaliação não tinha lugar e os professores existiam para ensinar.
Inferlizmente, a nossa Escola serve para educar, avaliar as crianças, entretê-las e colocá-las numa determinada posição.

A democratização rápida e súbita da Escola Portuguesa foi acompanhada pela entrada de professores sem as competências necessárias para serem professores. Esta situação resultou de uma grande desqualificação da formação inicial de professores, podendo-se considerar responsáveis por este facto a criação das Escolas Superiores de Educação e de Escolas Privadas. De modo a contribuir para a requalificar da Escola Portuguesa torna-se urgente lutar contra a desqualificação da formação inicial de professores.

Olga Pombo concluiu ainda que, para qualquer modelo de avaliação é necessário definir uma ideia de escola, uma escola que privilegie o ensino e a transmissão de conhecimentos, em que a palavra de ordem possa ser deixem-nos ensinar, uma escola que assuma que o seu destino essencial é cognitivo.

Paulo Guinote considerou prioritário assumir e defender uma posição: “queremos ou não um sistema de avaliação de professores?” Concordando com a resposta é afirmativa, então é importante definir que tipo de modelo pretendemos e demonstrar que o modelo proposto pelo governo não é bom devido às suas fragilidades.
O modelo proposto não serve, apresenta inúmeras desvantagens como o facto de dividir a carreira em duas, a existências de quotas para cada escola e para professores e é demasiado burocrático ,sendo falsamente objectivo com as suas medições e grelhas.

O modelo indicado para a avaliação de professores deve revelar equidade, todos devem ter a mesmas possibilidades do reconhecimento do seu valor, e ser transparente, não negociado em reuniões privadas.

No actual modelo de avaliação de professores apresentado pelo Ministério de Educação, os docentes serão avaliados pelos seus pares, é esta uma avaliação justa? Os professores que chegaram ao topo da carreira, chegaram lá beneficiando de um sistema de avaliação mais simples, serão os responsáveis pela avaliação. Os avaliadores deveriam ser candidatos ao cargo, devendo demonstrar competência para o cargo. A avaliação deveria ser pública, copiando um pouco o sistema do Ensino Superior, com a defesa pública de um relatório perante um júri.

A proposta, alternativa ao modelo de avaliação docente proposto pelo Ministério da Educação, apresentada pela Federação Nacional de Professores foi desenvolvida pela equipa da qual João Paulo Videira, especialista em avaliação, é membro. A Escola é um serviço público e gratuito que o estado presta à população sendo portanto necessário aferir a qualidade dos serviços prestados. A avaliação de desempenho docente é uma realidade incontornável, Portugal não está em condições sociais e económicas que lhe permitam dizer não vai proceder à avaliação de desempenho docente.

O actual sistema de avaliação incorre no risco de rotina e massificação do preenchimento das grelhas que constam dos formulários. Serão preenchidos uma vez, depois copiados e posteriormente formatados.

A avaliação de desempenho docente deve ser feita sem a ligar à progressão na carreira e deve pressupor uma ideia de escola

No modelo integrado, defendido pela Fenprof, o professor torna-se o agente central da sua avaliação, com uma forte componente auto-avaliativa alicerçada na confiança, uma co-avaliação que co-responsabiliza todos os elementos de um determinado grupo, sendo aplicado a nível nacional, e tendo em consideração o projecto educativo de cada escola. Outro ponto fundamental na avaliação de desempenho docente é a avaliação da Escola, das suas macroestruturas e departamentos disciplinares. Os docentes não podem ser responsabilizados pelo sucesso ou não de uma comunidade, um docente não faz uma Escola, a Escola é feita por todos os agentes que dela fazem parte.

O modelo integrado estabelece como ponto de partida o docente, integrado com o departamento, com o conselho educativo e com a avaliação externa. Os instrumentos proposto visam permitir ao docente esclarecer as suas opções e percurso escolhido.


Quando convidados a participarem no debate, colocando questões à mesa ou tecendo comentários sobre o tema em discussão, algumas pessoas da assistência consideraram importante, para uma maior clareza na formulação dos conceitos, distinguir avaliação de classificação. A avaliação deve ser entendida como uma reflexão sobre o desempenho podendo ser apresentado na forma de um relatório que incida nas práticas docentes de cada um. Os instrumentos usados devem ser uniformes, servindo o mesmo documento para o avaliado e para o avaliador.

Para alguns dos presentes, na circunstância actual não é possível defender que não dever haver avaliação de desempenho, mesmo que ideologicamente sejam contra. Embora avaliar seja incontornável o mesmo não deve ser afirmado em relação à classificação, é importante manter a luta contra a classificação, contra uma hierarquização dos professores.

Alguns dos presentes manifestaram-se contra o entendimento entre Plataforma Sindical dos Professores e o Ministério da Educação, considerando que este diminuiu a força dos professores, não tendo dado a importância devida aos 100 mil professores presentes na marcha da indignação, retirando-lhes a capacidade de resistência e desmobilizando-os.

As conclusões ficaram a cargo da mesa, com intervenções curtas de cada um dos oradores procurando responder às questões concretas que lhes foram dirigidas ou tecendo comentários gerais sobre as opiniões expressas pelo público. A oposição a este modelo de avaliação parece ser o ponto evidente de união dos professores. Por outro lado, a avaliação deve ser simples e equilibrada, centrada no domínio científico e pedagógico. Deve ser fundamentalmente formativa de modo que contribua para a melhoria da prática lectiva, e mista (contemplando avaliação interna e externa).

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