“É a incredulidade normal de um país que se habituou a não ser consistente nas opções e a não perseguir de forma consistente os objectivos.” “A incredulidade não é preocupante desde que os professores trabalhem.” Com estas duas frases, entre outras pérolas do eduquês que lhe inflama as meninges, o secretário de Estado Valter lemos reagiu à gargalhada, geral e espontânea, que se seguiu ao anúncio, por ele feito, segundo o qual, “em 2013 teremos em Portugal uma verdadeira escola inclusiva”.
Se os 1700 professores que no momento o ouviam tivessem sido possuídos de incredulidade, os “ah” ou os “oh”, ou outra qualquer interjeição de espanto, teriam ecoado fila a fila ou em coro. Mas, em vez disso, o que explodiu foi o riso que sanciona o ridículo. Sua excelência percebeu-o mas fez-se de tonto, como lhe competia, embora com alguma irritação. Já a segunda frase não lhe saiu da inteligência modesta. Foi antes a gota biliar de um fígado que se azeda, sempre que há professor por perto. Limpa do pastel de circusntância que mascara a verve básica, poderia ser traduzida mais ou menos assim: riam-se, riam-se, que logo choram!
E são para chorar as alterações recentes (D.L. Nº3/2008 e Lei 21/2008) impostas à chamada educação especial (que visa ciranças com necessidades educativas especiais, deficientes incluídas). Mais uma vez, o mote é poupar à custa dos que mais precisam e menos podem: acaba o limite de 20 alunos para as turmas que integravam as crianças desse tipo; pode aumentar o número destas em cada turma; e a aplicação da CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde) ao ensino reduzirá, estima-se, em mais de 50 por cento o número de crianças assistidas. Veja-se, por significativa, a declaração do director-geral respectivo ao Expresso, segundo o qual “há 27 mil alunos erradamente classificados como tendo necessidades educativas especiais de carácter permanente”, sendo certo que o universo sinalizado andará pelas 50.000 crianças.
A CIF é uma classificação desenhada para utilização no sector da saúde e não pensada para a intervenção que o Governo agora lhe atribui. A sua aplicação ao ensino deixará de fora milhares de crianças que têm necessidade de apoios educativos específicos. Sobre este erro monumental pronunciaram-se desfavoravelmente professores, pais, médicos, psicólogos, técnicos de serviço social e cientistas de renome, nacionais e internacionais, incluindo mesmo responsáveis directos na criação da CIF.
Por todas, e são tantas, veja-se a opinião da Sociedade portuguesa de Neuropediatira, expressa em documento donde extraio a seguinte passagem: “O apoio educativo deve ser fundamentado essencialmente em necessidades educativas particulares e não em necessidades de saúde. Daí a inadequação da CIF (um instrumento criado para fornecer uma linguagem interdisciplinar e para classificar os indivíduos com necessidades especiais, de acordo com as suas funções) como critério de elegibilidade de serviços de educação especial. Os apoios devem dirigir-se a necessidades individuais específicas de cada criança e não a “rótulos” ou “classificações”. Por outro lado, a fundamentação da decisão relativa ao apoio é da responsabilidade da educação, devendo a informação médica ser complementar e reforçar a informação educativa no processo de avaliação.”
Ou o que afirma o professor James Kauffman, citado pelo professor Luís de Miranda Correia, da Universidade do Minho: “A minha opinião é de que o uso da CIF na educação especial constituirá um erro sério, mesmo trágico. As definições clínicas de saúde e as educacionais não são de forma alguma apropriadas para os mesmos processos e profissões.”
Ou, ainda, a opinião do professor Rune Simeonsson (membro do grupo de trabalho que concebeu a CIF): “Estou muito decepcionado por Portugal ser talvez o primeiro país a usar a CIF de uma forma compreensiva, embora ela não tinha sido usada de uma forma correcta.”
Valter lemos diz não perceber todas estas críticas já que a CIF é “um instrumento que se usa no mundo inteiro”. Com tão linear lógica, admitirá o ilustre governante que o metro, ainda que usado no mundo inteiro, não serve para medir gasolina?
Artigo no Público de Santana Castilho, Professor do ensino superior
Se os 1700 professores que no momento o ouviam tivessem sido possuídos de incredulidade, os “ah” ou os “oh”, ou outra qualquer interjeição de espanto, teriam ecoado fila a fila ou em coro. Mas, em vez disso, o que explodiu foi o riso que sanciona o ridículo. Sua excelência percebeu-o mas fez-se de tonto, como lhe competia, embora com alguma irritação. Já a segunda frase não lhe saiu da inteligência modesta. Foi antes a gota biliar de um fígado que se azeda, sempre que há professor por perto. Limpa do pastel de circusntância que mascara a verve básica, poderia ser traduzida mais ou menos assim: riam-se, riam-se, que logo choram!
E são para chorar as alterações recentes (D.L. Nº3/2008 e Lei 21/2008) impostas à chamada educação especial (que visa ciranças com necessidades educativas especiais, deficientes incluídas). Mais uma vez, o mote é poupar à custa dos que mais precisam e menos podem: acaba o limite de 20 alunos para as turmas que integravam as crianças desse tipo; pode aumentar o número destas em cada turma; e a aplicação da CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde) ao ensino reduzirá, estima-se, em mais de 50 por cento o número de crianças assistidas. Veja-se, por significativa, a declaração do director-geral respectivo ao Expresso, segundo o qual “há 27 mil alunos erradamente classificados como tendo necessidades educativas especiais de carácter permanente”, sendo certo que o universo sinalizado andará pelas 50.000 crianças.
A CIF é uma classificação desenhada para utilização no sector da saúde e não pensada para a intervenção que o Governo agora lhe atribui. A sua aplicação ao ensino deixará de fora milhares de crianças que têm necessidade de apoios educativos específicos. Sobre este erro monumental pronunciaram-se desfavoravelmente professores, pais, médicos, psicólogos, técnicos de serviço social e cientistas de renome, nacionais e internacionais, incluindo mesmo responsáveis directos na criação da CIF.
Por todas, e são tantas, veja-se a opinião da Sociedade portuguesa de Neuropediatira, expressa em documento donde extraio a seguinte passagem: “O apoio educativo deve ser fundamentado essencialmente em necessidades educativas particulares e não em necessidades de saúde. Daí a inadequação da CIF (um instrumento criado para fornecer uma linguagem interdisciplinar e para classificar os indivíduos com necessidades especiais, de acordo com as suas funções) como critério de elegibilidade de serviços de educação especial. Os apoios devem dirigir-se a necessidades individuais específicas de cada criança e não a “rótulos” ou “classificações”. Por outro lado, a fundamentação da decisão relativa ao apoio é da responsabilidade da educação, devendo a informação médica ser complementar e reforçar a informação educativa no processo de avaliação.”
Ou o que afirma o professor James Kauffman, citado pelo professor Luís de Miranda Correia, da Universidade do Minho: “A minha opinião é de que o uso da CIF na educação especial constituirá um erro sério, mesmo trágico. As definições clínicas de saúde e as educacionais não são de forma alguma apropriadas para os mesmos processos e profissões.”
Ou, ainda, a opinião do professor Rune Simeonsson (membro do grupo de trabalho que concebeu a CIF): “Estou muito decepcionado por Portugal ser talvez o primeiro país a usar a CIF de uma forma compreensiva, embora ela não tinha sido usada de uma forma correcta.”
Valter lemos diz não perceber todas estas críticas já que a CIF é “um instrumento que se usa no mundo inteiro”. Com tão linear lógica, admitirá o ilustre governante que o metro, ainda que usado no mundo inteiro, não serve para medir gasolina?
Artigo no Público de Santana Castilho, Professor do ensino superior
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