segunda-feira, 13 de julho de 2009

A ilusão da ciência ou a exactidão dos sonhos entre exames e concursos


Todos os anos, mais ou menos por esta altura, somos confrontados com a dificuldade de compreender a exacta dimensão do significado dos resultados dos exames finais e todos os anos o governo nos brinda com o oximoro que mais convém para servir a agenda do momento.

Os resultados dos exames servem para tudo. Há um ano os resultados de matemática tinham subido em média. Dizia o governo que isso era o resultado da eficácia do plano nacional da matemática, da dedicação dos professores e da competência do governo. Este ano os resultados desceram e o inefável secretário de estado Valter Lemos lestamente veio anunciar que a responsabilidade era dos comentadores políticos, da Sociedade Portuguesa de Matemática e dos partidos.

O jogo de ilusões que o governo procura fazer passar é indescritível. Descarta responsabilidades quando convém, distribui culpas com a mesma leveza de quem distribui pétalas de flores, tenta adoçar a boca dos professores num dia e agride as suas associações profissionais no dia seguinte, ao sabor do vento e da conveniência. A exactidão do erro deste ministério é a única constante com que podemos contar.

Todos os anos, também mais ou menos por esta altura somos confrontados com os resultados da colocação de professores. Há três anos que não se realizava qualquer concurso para ingresso nos quadros. A expectativa dos 111 mil candidatos era enorme. Para muitos tratava-se de finalmente obter um vínculo profissional mais estável ao fim de muitos anos de serviço e para muitos outros tratava-se de conseguir obter colocação numa escola mais perto do seu local de residência que lhes permitisse recuperar o direito à sua vida privada.

A importância do resultado para a vida destas pessoas é gigante. Não é portanto compatível com a insignificância, a pequenez do pensamento de quem argumenta com o número bruto de professores colocados. A ilusão da ciência vem deste número: 30 mil professores colocados.

Mas é preciso dizer que estes são menos de um terço dos candidatos. E é preciso dizer mais. É preciso dizer com clareza quantos foram colocados no quadro pela primeira vez: apenas 417. Isto é, apenas 0,3 por cento dos candidatos. Mas é preciso ir mais longe e constatar que não entrou no quadro nenhum professor do ensino pré-escolar, nem do 1.º ciclo nem nenhum professor de matemática ou de português do 2.º ciclo.

Não é desta forma que se resolve o défice de oportunidade da aprendizagem. Resolver os problemas de uma escola desigual que, ano após ano reproduz desigualdade precisa de uma orientação coerente que invista na oferta educativa precoce e melhore a vinculação dos docentes aos projectos de educação dos locais. Que os comprometa e reconheça. Esse efeito não se obtém com uma relação precária. Contra a exactidão dos sonhos dos professores que esperam ver o seu trabalho reconhecido, o seu percurso profissional estabilizado, o governo só tem a manipulação da ilusão dos números para oferecer e o adiamento das expectativas. Em nome da ilusão de uma ciência falsificada que toma a parte pelo todo e promove os resultados de exame como o indicador da evolução da educação, o governo vai surfando a onda do momento e só contribui para agravar o equívoco.

Texto de Alda Macedo, em escola.info

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