terça-feira, 17 de março de 2009

Lutar contra o liberalismo educativo transnacional


Os estudos sobre a escola, que se têm realizado nos últimos anos, identificaram tendências claras de regulação das políticas públicas determinadas pelas agências internacionais, as quais são dominadas pelos países centrais. Esta regulação transnacional é imposta, umas vezes de forma subreptícia, outras de forma mais brutal, aos países periféricos e dependentes dos apoios económicos do FMI, do Banco Mundial, da UE e das outras agências do capitalismo globalizado.

Desde o início dos anos 80 do século passado que a corrente educativa liberal se tem afirmado, sobretudo a partir dos países anglo-saxónicos - EUA, Reino Unido, Austrália e Nova Zelândia. Essa afirmação teve por base um conjunto de razões que começaram a emergir nos finais dos anos 60, e década de 70, nomeadamente a redução ou estagnação dos orçamentos do ensino público em muitos desses países, a degradação resultante das condições de trabalho nos estabelecimentos escolares, os problemas de organização, de ensino e de disciplina criados pelo aumento significativo de alunos de meio popular e de diferentes minorias étnicas e finalmente a desvalorização dos diplomas escolares a que se juntou a recessão económica resultante do primeiro choque petrolífero.

Uma vez que as respostas dos profissionais a estes problemas foram débeis e pouco articuladas, o campo ficou aberto à iniciativa de outros grupos de influência compostos por universitários, administradores de educação, chefes de empresas e políticos associados à Nova Direita, os quais impuseram o modelo de mercado como o único remédio possível para os males do ensino público.

Também em Portugal, embora apenas a partir dos finais dos anos 80, a ideia da “democracia do cidadão”, que considerava a educação um bem comum a cargo do Estado e de profissionais da educação usufruindo de uma autonomia relativa, começou a ser substituída pela “democracia do consumo”, fundada sobre os princípios da soberania dos consumidores e na competição entre as pequenas unidades de produção que seriam os estabelecimentos de ensino.

Aos poucos começou a assitir-se à conjugação dessa lógica de mercado com uma lógica conservadora, defensora da tradição, da hierarquia e da moral, em discursos que valorizam a responsabilidade e autoridade parental e descrevem simultaneamente a ineficácia e a perda de valores dos profissionais das instituições públicas.

Discursos de gente com relevo na sociedade, como é o caso dos membros da Fundação Pró-Dignitate, ou de académicos ligados à Universidade Católica, apoiam-se também numa lógica modernista, que toma como símbolo a empresa e os seus métodos de gestão. À luz desta lógica os problemas educativos, tal como outros problemas sociais, passaram a ser vistos como problemas técnicos, de organização e de coordenação, para cuja solução se pede ao Estado que aposte na desconcentração das responsabilidades e na orientação para a procura por parte dos pais e das empresas assim como num maior enfoque nos resultados e na sua avaliação.

Numa altura em que ficou evidente o falhanço global das lógicas neoliberais, também na educação éfundamental que os profissionais se reorganizem e definam uma estratégia clara de luta contra estas tendências que visam a destruição da escola pública e a exploração de um mercado potencialmente muito lucrativo, como é o mercado do ensino, não permitindo que os sucessivos governos continuem a destruir o serviço público de educação para todos.

Texto de Francisco Santos, no blogue (Re)Flexões

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