quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Esta Avaliação dos Professores


Não somos naturalmente cooperativos, lembra Michel Crozier. Somos naturalmente discriminadores, disse, numa emissão de “O amor é”, Júlio Machado Vaz, noticiando que há mais de cento e cinquenta crianças seropositivas nas escolas portuguesas, sendo que são aconselhadas pelos técnicos competentes a esconder isso da escola.

A sociobiologia (com o desconforto ideológico que, de certo modo, me causa a sua alusão) também investe no esclarecimento da nossa natureza competidora. A nossa condição animal, explicará isto. O que é que nos diferencia e identifica como espécie? a cultura. É através dessa condição cultural da espécie humana que nos tornamos cooperativos; não discriminadores; conviria, não discricionários.

As outras espécies desenvolvem características de cooperação, de solidariedade, funcionais à sua sobrevivência e bem-estar. Na espécie humana a cultura sobreleva essa funcionalidade dos padrões de comportamento duráveis (instinto). E vai ao ponto de se elevar à educação para a cooperação, para a solidariedade, para a emancipação (palavra incómoda, que alguns querem desactualizada, vá-se lá saber porquê).

Usar a cultura para o reforço da instintiva competição, da discriminação, é, pela força destas, a reinvenção de uma legitimada barbárie pelo desvio para uma competição reforçada pelos poderosos instrumentos da cultura, para uma discriminação discricionária, bem mais cruéis e sofisticadamente auto-sustentadas do que as das outras espécies, revertidas em novas e naturalizadas formas de escravidão humana. A instituição capitalista “mais valia” é o zénite da naturalização desta escravidão. A instituição escolar “classificação” é-lhe absolutamente instrumental e imprescindível.

Os professores, ao recusarem este modo classificatório de Avaliação, estão a resistir à mudança para a sustentação de uma cultura burocrática que tão criativamente sabe colocar cada macaco no seu galho.

Em termos de condição competidora, chega bem o que temos de animal. A cultura serviria para a temperar e transcender em modos cooperativos e solidários de viver, recriando o que, sendo da nossa natureza animal, pela educação reverta em relações superiores, isto é, da condição humana.

O que aqui está em causa, não é a avaliação – factor de crescimento e aprendizagem, formativa, que outra não tem sentido no quadro da educação – mas a classificação, no seu mais genuíno apelo à competição, à discriminação, porventura, à discricionariedade.

Rosa Soares Nunes

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