sexta-feira, 17 de abril de 2009

O estranho caso do Agrupamento de Escolas de Santo Onofre


Quem vive em Caldas da Rainha e se interessa pelas coisas da Educação não pode ficar indiferente ao que se está a passar no Agrupamento de Escolas de Santo Onofre.

Desde os tempos em que os meus filhos por lá passaram, sempre elogiei a organização, a dinâmica e a qualidade do trabalho pedagógico desenvolvido na então EBI de Santo Onofre. De então para cá, acompanhei sempre com interesse e satisfação, as notícias das boas práticas que fizeram daquela escola um exemplo do que deve ser a escola pública. É pois com grande perplexidade que assisto ao irredutível impasse, entre professores e Ministério da Educação, em que degenerou o processo de implementação do novo modelo de gestão das escolas públicas do ensino básico e secundário, situação que ameaça corroer todo o capital de credibilidade que a escola granjeou junto da comunidade.

Percebo o que está na origem do problema, mas tenho dificuldade em entender como foi possível chegar ao ponto a que se chegou. Não tanto pelo lado do Ministério da Educação, que já demonstrou a sua total incapacidade para o diálogo e procura de compromissos, mas, sobretudo, pelo lado dos que souberam construir uma escola ao serviço da comunidade (que é para isso que serve a escola pública). Todo o processo me faz lembrar os tempos da “guerra fria” com as suas guerras “quentes” locais, em escalada, sob a tutela das superpotências dominantes.

A escola pública não pode continuar presa “no seu labirinto”, eternamente condenada a ter que escolher, como lucidamente disse António Barreto, entre ser uma “repartição do ministério” ou uma “fortaleza dos professores”. Se não é aceitável que o Ministério exonere um Conselho Executivo democraticamente eleito, também não é bom para a saúde da escola pública que os professores se comportem como se fossem os donos da escola, até porque não são, nem de facto, nem de direito. A escola pública merece ter outra alternativa e essa só pode passar pela sua apropriação pela comunidade em que se insere e a quem deve servir acima de tudo.

A chave para resolver o impasse a que se chegou no Agrupamento de Escolas de Santo Onofre, está aqui mesmo à frente do nariz, está na comunidade educativa da escola, comunidade da qual o corpo docente é parte integrante mas não a totalidade. Já alguém perguntou, por exemplo, aos pais e encarregados de educação, o que pensam disto tudo? Não são seus filhos e educandos os alunos que frequentam as escolas do agrupamento? Porque razão, no que diz respeito ao governo da escola, a opinião dos pais ou das autarquias pesa menos que a do Ministério da Educação ou da Fenprof? Se a razão está do lado dos professores, então não será difícil granjear o apoio dos pais e encarregados de educação o que, a acontecer, talvez fizesse o Ministério da Educação agir de outra maneira.

Um dos maiores perigos que ameaçam o ensino público é o de se instalar na sociedade a ideia de que a escola pública é irreformável (creio que ao alto nível político isso é já uma convicção), que qualquer tentativa de transformação esbarrará sempre com a resistência dos professores, em geral, e dos sindicatos, em especial. Reafirmo o que há algum tempo atrás disse, “inconfessáveis interesses sonham em plantar os seus cogumelos sobre a manta morta que vier a resultar da ruína da escola pública”. Não haverá vitória para qualquer das partes se no final da contenda só restarem destroços.

O caso do Agrupamento de Escolas de Santo Onofre faz-me recordar aquela história do rei Salomão sobre a criança cuja maternidade era disputada por duas mães, uma verdadeira e outra falsa. Reza a história que o rei Salomão, desembainhou a espada e ameaçou cortar a criança em duas partes e oferecer uma parte a cada uma das mães beligerantes. A falsa mãe, concordou, mas a verdadeira mãe, caindo aos pés do rei, pediu-lhe que entregasse a criança, viva, à falsa mãe. O sábio rei acabou por entregar a criança, sã e salva, à verdadeira mãe, aquela que, prescindindo de vencer a contenda, optou por manter viva a criança.

Edgar Ximenes, in Gazeta das Caldas

Sem comentários: