quinta-feira, 28 de maio de 2009

Ganhar a Escola Pública, reformar a ministra


"A reforma está ganha", diz Maria de Lurdes Rodrigues como quem quer convencer aqueles/as que não sabem o que se passa nas escolas. Na verdade, diz como quem tem de o dizer porque sabe que há praxes inalteráveis do poder. E ao dizer isto ostenta os números confrangedores da sua "vitória". Mas talvez os números impressionem alguém.

A Ministra da Educação utiliza os/as 80 mil que teriam entregue os objectivos individuais de avaliação para sancionar a sua política. Com isto, em primeiro lugar, desce a fasquia: afinal o número de professores/as e educadores/as que fizeram greve e que se manifestaram é claramente superior ao número dos que cumpriram um passo do processo de avaliação que a Ministra jurava ser obrigatório e que acarretaria as piores consequências para os infractores; afinal cerca de 50 mil, 38% dos professores/as, arriscaram a sua progressão na carreira ao desafiar directamente a prepotência do Ministério resistindo às ameaças (então senhora Ministra, os seus objectivos individuais neste item eram assim tão baixos?). Em, segundo lugar, utiliza abusivamente o número de quem entregou objectivos como confirmação das suas políticas: como sabemos muitos/as dos/as que entregaram os objectivos fizeram sob pressão e sob protesto mas continuam a não concordar com este modelo de avaliação.

"A reforma está ganha", insiste Maria de Lurdes Rodrigues no seu habitual tom agastado. Insiste como quem pretenderia dizer aos professores/as que já não vale a pena sair à rua no próximo sábado, que aconteça o que acontecer serão avaliados/as como ela dita. A voz parece firme mas sente-se que a política treme. Afinal quantas vezes já repetiu o número? E de simplex em simplex, as certezas arrogantes foram trocadas por remendos arrogantes. Quem sabe que mais estará disposta a mudar da sua "reforma ganha"?

"A reforma está ganha!" Maria de Lurdes Rodrigues já cansa e apetece interpelá-la, depois das recusas massivas de aplicar o "seu" modelo de avaliação, depois de remendos e alterações, afinal de que vitória fala?

E só aí a Ministra começa a esclarecer-nos quando acrescenta: "a ausência total de princípios mínimos de competição era muito negativa para as escolas". Sim, a sua vitória mede-se pela capacidade de sobrepor nas escolas o carreirismo individualista e o espírito competitivo aos laços de partilha, de solidariedade e de entre-ajuda. A sua vitória mede-se na cultura de aparência de rigor que consiste em preocupar-se mais em fazer portefólios e em mostrar eficácia ao avaliador do que em ensinar. A sua vitória mede-se pelo número de pequenos chefes que se instalarem nas escolas prontos a mandar para baixo e a obedecer para cima. A sua vitória mede-se pelo grau de empresarialização da Escola Pública.

E afinal só aqui percebemos que Maria de Lurdes não canta vitória apenas como aquele ministro da informação do Iraque que estava a ganhar a guerra com os EUA enquanto os tanques entravam em Bagdad... Porque o essencial não foi nunca o camaleónico modelo de avaliação e as suas grelhas que podiam ser assim ou "assadas". MLR sentirá que ganhou enquanto houver directores nas escolas, enquanto houver diferentes categorias de professores/as, enquanto houver quotas no acesso aos escalões superiores da profissão. Ganhar é partir os/as professores/as, vencer simbolicamente a resistência e poupar uns trocos pelo caminho. Ganhar é burocratizar na cabeça de quem só a burocracia traz ganhos.

E no próximo sábado é tempo de dizer que esta reforma não está ganha. De reformar a ministra. E de voltar a ganhar a escola pública.

Artigo de Carlos Carujo em
Esquerda.net

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