Foi uma intervenção muito interessante e como tal considerámos pertinente colocá-la aqui apesar de o Fórum ter decorrido há uma semana mas só agora tivemos acesso ao texto escrito.
AULA MAGNA, 14/12/2008
Começo por saudar a esquerda presente nesta sala e toda aquela que gostaria de ter vindo mas não pôde estar presente;
Saúdo os que hoje, nos diferentes painéis animaram e participaram nos debates;
Saúdo a Ana Drago: é um prazer voltar a encontrar-me consigo e com as suas ideias claras na defesa da Escola Pública e porque tem sido uma voz persuasiva na luta dos professores
Saúdo o Amigo e Camarada Manuel Alegre: deixe-me agradecer-lhe o convite que me trouxe a este Fórum, convite esse que eu não pude recusar pela elevada admiração que tenho por si e pelas lutas que tem travado pelos ideais de esquerda.
Constituirá surpresa para muitos (e para mim também!) a minha presença neste Fórum Democracia e Serviços Públicos porque sempre fiz o meu percurso de vida como cidadã atenta e empenhada, sem nunca procurar o protagonismo que esta política me obrigou a ter.
-Não digo que não a um desafio, quando se trata do encontro de uma grande família política de esquerda, principalmente quando a minha família política mais próxima, em quem eu depositei o meu voto, me tem vindo a desiludir afastando-se dos valores que legitimamente poderia esperar de uma política assumidamente de esquerda. Se não se pode suspender a Democracia, também não se podem suspender os valores que nos guiam politicamente.
- Tive a oportunidade de poder denunciar na comunicação social, a propósito da posição da minha escola no ranking, as tensões e o desencanto que passaram a fazer parte do quotidiano das Escolas e por esse facto tenho continuado a “dar a cara” por esta luta que tarda em chegar ao fim simplesmente por teimosia de quem está convencido de que reconhecer um erro é uma vergonha ou uma diminuição da autoridade. (Receio mesmo que este Governo esteja a estimular o culto perigoso da autoridade)
Perguntem aos professores mais experientes, que já assumiram erros perante os seus alunos, se esse gesto não reforçou a sua credibilidade.
Há um erro cívico grave que se pode confundir com coragem: é a temeridade. Se para demonstrar coragem não avaliamos devidamente as consequências dos nossos actos, corremos o risco de sermos simplesmente temerários. Não estará a acontecer isto, neste momento, na equipa ministerial?
Nestes últimos anos dei comigo a pensar: será que, antes de votar, não li bem as bases programáticas do PS no que se refere à Educação? Resolvi relê-las e no Capítulo II, Novas Políticas Sociais, no ponto I.1 – Mais e Melhor Educação, pude reler :
“A lógica política do PS não é prometer tudo a todos, nem proceder a mais uma revolução no papel. É sim, tendo plena consciência da educação como factor insubstituível de democracia e desenvolvimento, pôr em prática políticas que consigam obter avanços claros e sustentados, na organização e gestão dos recursos educativos, na qualidade das aprendizagens e na oferta de várias oportunidades a todos os cidadãos para melhorarem os seus níveis e perfis de formação.
Para melhorar as qualidades das aprendizagens é necessário definir que perfil de aluno queremos, formar na Escola pública, que currículos a suportariam, para atingir o perfil de aluno: uma das grandes falhas desta equipa ministerial foi a ausência de orientações sobre escola pública: sobre isto foi dito nada.
Na ausência dessa linha orientadora, a imagem que tem passado para a população e para os próprios professores é a de que o sucesso tem que ser alcançado a todo o custo (discurso fácil para a população mas manipulador), a fim de disfarçar através da estatística, a qualidade de ensino que outros países com outros meios e com políticas coerentes alcançaram.
Esta atitude só por si foi uma medida que desautorizou o professor cuja função é ensinar com rigor e exigir resultados do seu trabalho e que não se compadece com os facilitismos presentes na criação de uma panóplia de cursos alternativos de rigor duvidoso, entendidos como “oferta de várias oportunidades a todos os cidadãos para melhorarem os seus níveis e perfis de formação”
Ainda no Capítulo II, Novas Políticas Sociais, no ponto I.1 – Mais e Melhor Educação, pude reler
“Definiremos também um programa nacional de formação de professores, com explicitação de perfis de desempenho…. A avaliação do desempenho dos professores, neste contexto, deve ser acompanhada por “iniciativas que aumentem a motivação e a auto-estima dos professores”…
Fazendo uma sinopse das medidas deste Ministério é claríssimo para todos que não faz parte dos seus objectivos a motivação e a auto-estima dos professores”
Vejamos:
- Aumento da carga horária lectiva dos professores e fim das reduções lectivas na maior parte da ocupação dos cargos, o que se traduziu numa redução do número de horários disponíveis;
- Congelamento da progressão na carreira;
- Estatuto da carreira docente com a divisão da carreira em professores titulares e professores, (havendo apenas 30%. Que têm acesso a professores titulares) Daqui resulta que 2/3 da classe não progride, não ultrapassando o salário correspondente actualmente a 1500 Euros..
- Modelo de Avaliação de Desempenho burocrático, inexequível, gerador de conflitos…
Não é difícil inferir qual é o grande objectivo: uma política meramente economicista!
Já no painel sobre Educação realizado de manhã, o Professor Licínio Lima afirmou, numa intervenção brilhante, que na política educativa, a palavra economia substituiu a palavra pedagogia.
A forma como estas medidas economicistas foram implementadas constituíram um golpe profundo na dignidade dos professores, causador de uma profunda insatisfação e mesmo humilhação, de tal modo que mesmo quem dedicou a sua vida a formar, transmitindo conhecimentos, está neste momento desmotivado e sai antecipadamente do sistema.
E não sai com pena, nem com saudades daquilo que deixa, sai derrotado, penalizado e paradoxalmente feliz por abandonar a profissão de uma vida.
Antes desta “turbulência” quem saía sentia nostalgia, amargura, saudades, tinha pena de ter atingido a idade da reforma (60 anos ou menos); hoje, quase todos, queriam ser mais velhos para poderem ir embora! Sentem-se desconsiderados, humilhados por uma reforma que ignorou o trabalho e a dedicação passados.
Com esta “debandada” dos Professores atinge-se de igual modo o grande objectivo: o Ministério da Educação deixa de pagar ordenados mais elevados uma vez que aumenta a mão-de-obra barata para além de que as reformas, com as penalizações, saem mais baratas ao estado, que assim poupa mais alguns euros…Para as estatísticas a solução é óptima: diminui a taxa de desemprego entre os licenciados.
Hoje, a desmotivação é grande… a Escola deixou de ser um local aprazível para passar a ser um palco de fricções e de fracções entre professores! A mudança de paradigma educativo, seja a nível da gestão das escolas, seja a nível da avaliação dos professores, foi abruptamente/unilateralmente imposta pela tutela, sem a preocupação de envolver, formar e conquistar os docentes para este processo de mudança.
A hierarquização e a diferenciação na carreira dos professores foi a grande afronta feita à classe devido à artificialidade e arbitrariedade de que se revestiu o concurso para professores titulares, ao serem tidos em conta apenas os últimos sete anos da sua carreira.
Carreiras de muitos anos, tarefas e cargos desempenhados com todo o rigor e profissionalismo, foram simplesmente omitidos.
A instabilidade está instalada e a culpa não é dos professores. É intolerável o comportamento desta equipa ministerial que em vez de promover a tranquilidade e a serenidade, indispensáveis ao bom funcionamento das escolas gera o conflito e a instabilidade e tenta fazer crer à opinião pública que os professores não querem ser avaliados. Nós queremos ser avaliados, não nos vencerão pelo cansaço, cansados estamos todos de sermos enxovalhados em praça pública.
Como disse Bertolt Brecht
“Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violentas às margens que o oprimem”.
Finalmente, no Capítulo II, Novas Políticas Sociais, no ponto I.1 – Mais e Melhor Educação, pude reler
“Sem rupturas indesejáveis continuaremos no caminho do reforço da participação das famílias e comunidades na direcção estratégica dos estabelecimentos de ensino e no favorecimento da constituição de lideranças fortes. Estabelecido um quadro comum a todas as escolas e agrupamentos – colegialidade na direcção estratégica, participação da comunidade local, gestão executiva a cargo de profissionais da educação – serão admitidas e estimuladas diferentes formas de organização e gestão”
O decreto lei 15 / 2007 que regula o novo regime de autonomia das escolas, não prevê nenhuma outra forma de gestão que não seja a gestão unipessoal com os poderes concentrados no Director.
Relativamente a esta “figura” é de salientar que a prática directiva estabelecida pelo Decreto-lei 115-A/98, possibilitando a opção por uma direcção colegial ou por uma gestão unipessoal, levou a que a quase totalidade das escolas tivesse enveredado pela direcção colegial, demonstrando assim os bons resultados decorrentes desta modalidade, construídos pelo empenho e dedicação dos membros dos Conselhos Executivos.
O Governo precisou de pôr fim à gestão democrática nas escolas. Não se afiguram razões para a excessiva concentração de poderes num Director, a não ser que esta imposição tenha como objectivo assegurar a aplicação cega e acrítica de todas as medidas emanadas da 5 de Outubro, bem como a domesticação dos professores e o seu silenciamento.
O M.E., com as leis do ECD, da Gestão e Administração das Escolas, do processo de Avaliação de Desempenho dos professores e muito especialmente, com o argumentário político com que as sustentou, reforçou intencionalmente a ilusão mais enganadora que se poderia imaginar neste sector: a ideia de que, havendo muito insucesso e abandono escolar em Portugal, a culpa era dos professores.
Vi este ponto bem exemplificado num recente artigo de opinião com o seguinte raciocínio: Existe muito insucesso e abandono escolar no nosso país. A culpa é dos professores. Logo proceda-se à avaliação, nem que para isso seja necessário importar um modelo da América Latina.
Como uma camada de nevoeiro espesso que se espalha numa região em estação fria, aumentando o gelo que perturba fortemente a mobilidade e a actividade das pessoas, também esta ilusão continua a cair como arma assassina em cima dos professores. De repente, com esta equipa esqueceram-se os principais factores nacionais geradores do abandono e do insucesso:
as condições sócio-económicas de muitos dos nossos alunos e dos seus pais;
a desagregação das famílias e respectiva ausência de autoridade;
a cultura dominante de que o êxito se consegue sem esforço ou que tudo tem de ser tornado fácil para se atingirem objectivos;
a desvalorização social da Escola e dos seus agentes, entre outros.
Fez-se cair toda a culpa na organização da Escola e no seu corpo docente.
Com que fundamento ou intenção se procedeu deste modo se só há pouco tempo se desencadeou o processo de avaliação das Escolas e os primeiros resultados são todos muito positivos?
Se não houve intenção escondida, houve, no mínimo, erro político grave, nunca reconhecido pelos seus responsáveis, apesar de avisos vários.
E este erro político acrescentou veneno mortal à relação entre os professores e a Srª Ministra da Educação.
Continuamos a luta pois a razão está do nosso lado.
Parafraseando Mia Couto:
Temos uma arma de construção massiva: a capacidade de pensar e como diz o meu camarada Manuel Alegre, o pensamento é livre como o Vento.
Rosário Gama
Começo por saudar a esquerda presente nesta sala e toda aquela que gostaria de ter vindo mas não pôde estar presente;
Saúdo os que hoje, nos diferentes painéis animaram e participaram nos debates;
Saúdo a Ana Drago: é um prazer voltar a encontrar-me consigo e com as suas ideias claras na defesa da Escola Pública e porque tem sido uma voz persuasiva na luta dos professores
Saúdo o Amigo e Camarada Manuel Alegre: deixe-me agradecer-lhe o convite que me trouxe a este Fórum, convite esse que eu não pude recusar pela elevada admiração que tenho por si e pelas lutas que tem travado pelos ideais de esquerda.
Constituirá surpresa para muitos (e para mim também!) a minha presença neste Fórum Democracia e Serviços Públicos porque sempre fiz o meu percurso de vida como cidadã atenta e empenhada, sem nunca procurar o protagonismo que esta política me obrigou a ter.
-Não digo que não a um desafio, quando se trata do encontro de uma grande família política de esquerda, principalmente quando a minha família política mais próxima, em quem eu depositei o meu voto, me tem vindo a desiludir afastando-se dos valores que legitimamente poderia esperar de uma política assumidamente de esquerda. Se não se pode suspender a Democracia, também não se podem suspender os valores que nos guiam politicamente.
- Tive a oportunidade de poder denunciar na comunicação social, a propósito da posição da minha escola no ranking, as tensões e o desencanto que passaram a fazer parte do quotidiano das Escolas e por esse facto tenho continuado a “dar a cara” por esta luta que tarda em chegar ao fim simplesmente por teimosia de quem está convencido de que reconhecer um erro é uma vergonha ou uma diminuição da autoridade. (Receio mesmo que este Governo esteja a estimular o culto perigoso da autoridade)
Perguntem aos professores mais experientes, que já assumiram erros perante os seus alunos, se esse gesto não reforçou a sua credibilidade.
Há um erro cívico grave que se pode confundir com coragem: é a temeridade. Se para demonstrar coragem não avaliamos devidamente as consequências dos nossos actos, corremos o risco de sermos simplesmente temerários. Não estará a acontecer isto, neste momento, na equipa ministerial?
Nestes últimos anos dei comigo a pensar: será que, antes de votar, não li bem as bases programáticas do PS no que se refere à Educação? Resolvi relê-las e no Capítulo II, Novas Políticas Sociais, no ponto I.1 – Mais e Melhor Educação, pude reler :
“A lógica política do PS não é prometer tudo a todos, nem proceder a mais uma revolução no papel. É sim, tendo plena consciência da educação como factor insubstituível de democracia e desenvolvimento, pôr em prática políticas que consigam obter avanços claros e sustentados, na organização e gestão dos recursos educativos, na qualidade das aprendizagens e na oferta de várias oportunidades a todos os cidadãos para melhorarem os seus níveis e perfis de formação.
Para melhorar as qualidades das aprendizagens é necessário definir que perfil de aluno queremos, formar na Escola pública, que currículos a suportariam, para atingir o perfil de aluno: uma das grandes falhas desta equipa ministerial foi a ausência de orientações sobre escola pública: sobre isto foi dito nada.
Na ausência dessa linha orientadora, a imagem que tem passado para a população e para os próprios professores é a de que o sucesso tem que ser alcançado a todo o custo (discurso fácil para a população mas manipulador), a fim de disfarçar através da estatística, a qualidade de ensino que outros países com outros meios e com políticas coerentes alcançaram.
Esta atitude só por si foi uma medida que desautorizou o professor cuja função é ensinar com rigor e exigir resultados do seu trabalho e que não se compadece com os facilitismos presentes na criação de uma panóplia de cursos alternativos de rigor duvidoso, entendidos como “oferta de várias oportunidades a todos os cidadãos para melhorarem os seus níveis e perfis de formação”
Ainda no Capítulo II, Novas Políticas Sociais, no ponto I.1 – Mais e Melhor Educação, pude reler
“Definiremos também um programa nacional de formação de professores, com explicitação de perfis de desempenho…. A avaliação do desempenho dos professores, neste contexto, deve ser acompanhada por “iniciativas que aumentem a motivação e a auto-estima dos professores”…
Fazendo uma sinopse das medidas deste Ministério é claríssimo para todos que não faz parte dos seus objectivos a motivação e a auto-estima dos professores”
Vejamos:
- Aumento da carga horária lectiva dos professores e fim das reduções lectivas na maior parte da ocupação dos cargos, o que se traduziu numa redução do número de horários disponíveis;
- Congelamento da progressão na carreira;
- Estatuto da carreira docente com a divisão da carreira em professores titulares e professores, (havendo apenas 30%. Que têm acesso a professores titulares) Daqui resulta que 2/3 da classe não progride, não ultrapassando o salário correspondente actualmente a 1500 Euros..
- Modelo de Avaliação de Desempenho burocrático, inexequível, gerador de conflitos…
Não é difícil inferir qual é o grande objectivo: uma política meramente economicista!
Já no painel sobre Educação realizado de manhã, o Professor Licínio Lima afirmou, numa intervenção brilhante, que na política educativa, a palavra economia substituiu a palavra pedagogia.
A forma como estas medidas economicistas foram implementadas constituíram um golpe profundo na dignidade dos professores, causador de uma profunda insatisfação e mesmo humilhação, de tal modo que mesmo quem dedicou a sua vida a formar, transmitindo conhecimentos, está neste momento desmotivado e sai antecipadamente do sistema.
E não sai com pena, nem com saudades daquilo que deixa, sai derrotado, penalizado e paradoxalmente feliz por abandonar a profissão de uma vida.
Antes desta “turbulência” quem saía sentia nostalgia, amargura, saudades, tinha pena de ter atingido a idade da reforma (60 anos ou menos); hoje, quase todos, queriam ser mais velhos para poderem ir embora! Sentem-se desconsiderados, humilhados por uma reforma que ignorou o trabalho e a dedicação passados.
Com esta “debandada” dos Professores atinge-se de igual modo o grande objectivo: o Ministério da Educação deixa de pagar ordenados mais elevados uma vez que aumenta a mão-de-obra barata para além de que as reformas, com as penalizações, saem mais baratas ao estado, que assim poupa mais alguns euros…Para as estatísticas a solução é óptima: diminui a taxa de desemprego entre os licenciados.
Hoje, a desmotivação é grande… a Escola deixou de ser um local aprazível para passar a ser um palco de fricções e de fracções entre professores! A mudança de paradigma educativo, seja a nível da gestão das escolas, seja a nível da avaliação dos professores, foi abruptamente/unilateralmente imposta pela tutela, sem a preocupação de envolver, formar e conquistar os docentes para este processo de mudança.
A hierarquização e a diferenciação na carreira dos professores foi a grande afronta feita à classe devido à artificialidade e arbitrariedade de que se revestiu o concurso para professores titulares, ao serem tidos em conta apenas os últimos sete anos da sua carreira.
Carreiras de muitos anos, tarefas e cargos desempenhados com todo o rigor e profissionalismo, foram simplesmente omitidos.
A instabilidade está instalada e a culpa não é dos professores. É intolerável o comportamento desta equipa ministerial que em vez de promover a tranquilidade e a serenidade, indispensáveis ao bom funcionamento das escolas gera o conflito e a instabilidade e tenta fazer crer à opinião pública que os professores não querem ser avaliados. Nós queremos ser avaliados, não nos vencerão pelo cansaço, cansados estamos todos de sermos enxovalhados em praça pública.
Como disse Bertolt Brecht
“Do rio que tudo arrasta, diz-se que é violento. Mas ninguém chama violentas às margens que o oprimem”.
Finalmente, no Capítulo II, Novas Políticas Sociais, no ponto I.1 – Mais e Melhor Educação, pude reler
“Sem rupturas indesejáveis continuaremos no caminho do reforço da participação das famílias e comunidades na direcção estratégica dos estabelecimentos de ensino e no favorecimento da constituição de lideranças fortes. Estabelecido um quadro comum a todas as escolas e agrupamentos – colegialidade na direcção estratégica, participação da comunidade local, gestão executiva a cargo de profissionais da educação – serão admitidas e estimuladas diferentes formas de organização e gestão”
O decreto lei 15 / 2007 que regula o novo regime de autonomia das escolas, não prevê nenhuma outra forma de gestão que não seja a gestão unipessoal com os poderes concentrados no Director.
Relativamente a esta “figura” é de salientar que a prática directiva estabelecida pelo Decreto-lei 115-A/98, possibilitando a opção por uma direcção colegial ou por uma gestão unipessoal, levou a que a quase totalidade das escolas tivesse enveredado pela direcção colegial, demonstrando assim os bons resultados decorrentes desta modalidade, construídos pelo empenho e dedicação dos membros dos Conselhos Executivos.
O Governo precisou de pôr fim à gestão democrática nas escolas. Não se afiguram razões para a excessiva concentração de poderes num Director, a não ser que esta imposição tenha como objectivo assegurar a aplicação cega e acrítica de todas as medidas emanadas da 5 de Outubro, bem como a domesticação dos professores e o seu silenciamento.
O M.E., com as leis do ECD, da Gestão e Administração das Escolas, do processo de Avaliação de Desempenho dos professores e muito especialmente, com o argumentário político com que as sustentou, reforçou intencionalmente a ilusão mais enganadora que se poderia imaginar neste sector: a ideia de que, havendo muito insucesso e abandono escolar em Portugal, a culpa era dos professores.
Vi este ponto bem exemplificado num recente artigo de opinião com o seguinte raciocínio: Existe muito insucesso e abandono escolar no nosso país. A culpa é dos professores. Logo proceda-se à avaliação, nem que para isso seja necessário importar um modelo da América Latina.
Como uma camada de nevoeiro espesso que se espalha numa região em estação fria, aumentando o gelo que perturba fortemente a mobilidade e a actividade das pessoas, também esta ilusão continua a cair como arma assassina em cima dos professores. De repente, com esta equipa esqueceram-se os principais factores nacionais geradores do abandono e do insucesso:
as condições sócio-económicas de muitos dos nossos alunos e dos seus pais;
a desagregação das famílias e respectiva ausência de autoridade;
a cultura dominante de que o êxito se consegue sem esforço ou que tudo tem de ser tornado fácil para se atingirem objectivos;
a desvalorização social da Escola e dos seus agentes, entre outros.
Fez-se cair toda a culpa na organização da Escola e no seu corpo docente.
Com que fundamento ou intenção se procedeu deste modo se só há pouco tempo se desencadeou o processo de avaliação das Escolas e os primeiros resultados são todos muito positivos?
Se não houve intenção escondida, houve, no mínimo, erro político grave, nunca reconhecido pelos seus responsáveis, apesar de avisos vários.
E este erro político acrescentou veneno mortal à relação entre os professores e a Srª Ministra da Educação.
Continuamos a luta pois a razão está do nosso lado.
Parafraseando Mia Couto:
Temos uma arma de construção massiva: a capacidade de pensar e como diz o meu camarada Manuel Alegre, o pensamento é livre como o Vento.
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